domingo, 9 de setembro de 2007

Tô sabendo!

Camarada X, será que você é tão – bem, vamos dizer assim: humilde quanto eu? Quer dizer, quando alguém (em geral, nitidamente filisteu) te pergunta se você manja de Nietzsche, você é tão escrupuloso que responde que não, só porque AINDA não leu a mais recente tese de doutoramento da Universidade de Freiburg sobre o emprego de Ich na obra do bigodudo, especialmente no Nascimento da Tragédia?

Vejamos: no Inglês você só arranha, mesmo tendo lido Ulysses no original, além de ficar traduzindo todos os dias, antes de dormir, pelo menos uns quatro parágrafos de Finnegans Wake, só pra ver se melhora um pouco sua compreensão das estruturas gramaticais? E do Godardzzzzzz, você viu quase todos os 7.000 filmes (talvez somente 6.780, mais exatamente 6.783), leu pelo menos uns três catataus de semiótica do acossado (lá-lá-lá-lá...), conseguiu explicar pra sua avó (é sempre a avó o paradigma do filisteísmo, coitadinha dela) cada uma das alusões à Sã Doutrina em Je Vous Salue, Marie e, de quebra, com uma análise originalíssima, convenceu a velhota de que Godard estava na verdade é anunciando as Boas Novas, aquele devoto?

Mas, apesar disso tudo, ainda insiste em que Godard você curte, e não vai negar que bastante, mas que, se por acaso sabe alguma coisa do cineasta – e olha que é só em caráter hipotético, por favor –, não é nada mais que senso comum entre quem gosta um pouquinho que seja de cinema?

Camarada, Camarada X, chega de mentiras e de falsa modéstia (e estou me dirigindo também a mim). Chega de hesitar, chega de se esconder. Como um sábio blogueiro já disse, quando você não tiver certeza sobre alguma coisa a seu próprio respeito, sempre assuma a opinião mais megalomaníaca possível. A humildade era pra ser a virtude capital à intelligentsia e ao espírito que supostamente a orienta, o iluminista (ai, que contradição, já que de humilde o Iluminismo não tinha nada); a humildade sempre traria à mente a lembrança do caráter permanentemente provisório e progressivo do conhecimento científico. Mas um Richard Dawkins da vida está aí pra mostrar que isso tudo não passa de groselha.

É hora de pularmos para o outro lado, se quisermos fazer alguma coisa, se quisermos ser grandes e alcançar de uma vez por todas aquele futuro promissor que a professora da escolinha prometia pra mãe da gente. Tipo, se você só descobriu que Night and Day é do Cole Porter porque baixou a trilha sonora de Jumanji inteirinha pelo E-mule, mas alguém um dia mencionar o compositor numa conversa, mesmo que incidentalmente e muito por alto, interrompa-o na hora e conte que você absolutamente a-do-ra Cole Porter, que não tem uma música de que você não goste. E de Glauber Rocha, então! Sabe Gangues de Nova York, aquela câmera girando em torno dos atores enquanto eles partiam pra porrada? Hã, pois é referência a O Deus e o Capeta em Terra de Sol, tá ligado?

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