sábado, 16 de agosto de 2008

Comentadores Malvadões - o Filme

Advertência: as fotos de Natalie Portman se prestam unicamente a distrair os eventualmente ofendidos pelo texto a seguir, estando portanto desvinculadas do conteúdo do mesmo.

Oiiiiiiii.

Num dos tantos livros de Aristóteles dos quais só nos restam fragmentos, Da Chatice, o Filósofo distingue dois tipos de chatos, a saber: o chato por conhecimento e o chato por ignorância. O primeiro é chato por muito saber, aborrecendo as pessoas com discursos corretos, mas “excessivos”. Aristóteles diz literalmente “aquele que calca o saco”, referindo-se a como é visto o chato por conhecimento. O segundo chato o é por não saber o bastante, porque, como Aristóteles adverte, “todos sabem algo, mas ocorre não saberem na medida”, sendo que aquele que é chato por não saber o bastante alardeia saber o que não sabe, dizendo coisas que pessoas inteligentes (Aristóteles diz “aqueles não-otários”, mas também “os dificilmente vislumbráveis”) logo percebem ser embustes (“groselha”, conforme o Filósofo).

Ora, this is ourselves under pressure.

Uma coisa que os antigos ficaram nos devendo por se tratar de algo óbvio pra eles é que as pessoas podiam ser inteligentes, e inclusive dizer coisas inteligentes, sem ser chatas. Na verdade, elas só eram de fato inteligentes se o fossem entretendo aos demais. Como bobos. Platão jamais escreveria, por exemplo, a Crítica da Razão Pura, uma das maiores grosserias jamais cometidas contra o ser humano, tamanho o mau gosto dos períodos kantianos. Por sinal, “períodos kantianos” é também uma tremenda grosseria.

Nesse sentido, a seriedade é um dos maiores impedimentos que existem para que a chatice seja erradicada do mundo. Faz lembrar uma proposta de roteiro que eu submeti à avaliação de uma produtora independente e até agora não recebi resposta.

O filme se chamaria Comentadores Malvadões – o Filme. Fala de uma organização semi-secreta de comentadores de blog que criou uma intrincada e influente rede de comentários chatinhos, geralmente mal-educados e eventualmente ameaçadores, a blogs de pés-rapados que só escrevem por diversão. Os Comentadores Malvadões respiraram uma toxina liberada pelas plantas de um filme do Shyamalan, fazendo com que eles perdessem todo o pouco senso de humor que tinham e ficassem muuuuuito sérios.

A história começa quando um grupo de blogueiros de Itapecerica da Serra tem sua caixa de comentários covardemente atacada por membros da sociedade semi-secreta, que defende, de maneira bastante duvidosa, como valores – Imparcialidade, Respeito e Tolerância, as três virtudes teologais da bundamolice intelectual contemporânea.

Numa conversa por MSN – uma clara referência a Closer, quando Jude Law e Clive Owen elegantemente simulam praticar sexo virtual, uma contundente crítica do diretor Mike Nichols à artificialidade das novas formas de interação humana, mera ficção de um escritor hábil, personagem de Jude Law no filme, etc e tal – um dos blogueiros de Itapecerica da Serra confronta um dos Comentadores Malvadões, por acaso mãe do diretor Kevin Smith. Eis um trecho:

“Mas se eu rebolar, quer dizer que eu sou viado?”

“Não, se você rebolar, você vira viado. Vira. Se vira, quer dizer que antes não era. Mas depois fica sendo. É diferente, saca?”

Tem que ter as filosofias na cabeça pra entender a profundidade do raciocínio, uma clara referência à Filosofia tal como nasceu na afirmação de Tales de que tudo é água, isto é, a protoproposição da unidade de todas as coisas, fundamento e anseio último da Ratio, etc e tal. E há também um confronto com sabres de luz, com a participação especial do Chris Martin, uma clara referência ao Coldplay, que também pode ser responsável pela trilha sonora do filme, com músicas sobre as dificuldades de relacionamento contemporâneas quando a conectividade é um valor tão abstrato, tão virtual, etc e tal. Outra clara referência do filme é que Chris Martin aparece lendo O que é o Virtual?, de Pierre Lévy, uma clara referência a Pierre Lévy, teórico da informação, etc e tal.

Como se vê, é um filme cheio de referências, o que acaba selecionando muito bem o seu público, apenas pessoas inteligentes que entendem referências muito sutis com sabres de luz.

Na cena final, um dos blogueiros de Itapecerica da Serra, disfarçado de oficial da SS, faz um discurso inflamado sobre o que é um blog de cinema:

“Blog de cinema é um negócio onde pessoas que não sabem nada de cinema profissionalmente (graças a Deus) poderiam escrever sobre os filmes que viram do jeito que quisessem, inclusive tirando sarro, apesar de vir um monte de fã chato de coisa ruim encher o saco porque a gente meteu o pau no que não podia. No que não podia, essa é a idéia. Mas a gente pode. Somo tudo comédia.”

E termina dizendo:

“Sois homens, e não comentadores de blog!”

Uma clara referência a O Grande Ditador, reafirmando mais uma vez a liberdade como apanágio incontestável do ser humano, desde que exercida com o esteio da inteligência, etc e tal.

Porque who are they to judge us, simply because our hair is long.

Natalie achou este post muito engraçado.

Comentário antecipado ao filme: “Comentadores Malvadões – o Filme discute as redes de influência estabelecidas anonimamente entre fãs de artigos da cultura de massa. Uma sátira ao espírito de rebanho da juventude contemporânea. É desde já um clássico contestador.”

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