terça-feira, 11 de setembro de 2007

Latino: o maior compositor brasileiro


Já caminhávamos para a primeira metade da década de 90. O mundo musical assistia absorto ao crescimento exponencial dos sertanejos e pagodeiros, assolando as frequências musicais e vendendo discos aos borbotões(há, o doce mundo pré-internet...). O rock brasileiro agonizava dolorosamente, e teria sido muito pior se não tivesse o exíguo espaço na mídia proporcionado pela na época recém-inaugurada MTV brasileira, lembrando-se que o alcance da emissora na época era mínimo, o que não melhorava muito a situação dos nossos "roqueiros" (sic) . Nesse cenário, francamente favorável para os compositores populares que soubessem interpretar os anseios musicais de todo um novo público, que queria ser tomado por músicas fáceis, que já viessem no piloto automático, dizendo as palavras mais simples e diretas da maneira que eles queriam ouvir, sem surpresas e sem espaço para questionamentos existenciais mais profundos e ousadias musicais desnecessárias, com os "eu te amo" no lugar certo e os "volta pra mim" também, aparecia o nosso maior hitmaker.

Latino. O pioneiro do funk. O precursor do charm. O compositor de músicas que atingiriam o patamar mais alto que uma canção poderia aspirar alcançar, o de mudar padrões comportamentais e influenciar pessoas. A música que lançou esse carioca da remota cidade de Maria da Graça nos braços do sucesso foi a colossal Me Leva. Com um clima de funk-cabaré de fazer corar um Soft Cell da vida, com versos imortais como "me leva, me leva que eu te quero me leva, me leva que o futuro nos espera", Latino estourou nas paradas de todo o Brasil (momento Eli Corrêa) e colocou o seu nome no hall dos grandes ídolos populares. Com o seu sucesso, Latino abriu as portas para outros artistas do chamado "funk meloso carioca", como os já esquecidos Copacabana Beat e a dupla Claudinho e Buchecha (os Hall & Oates tupiniquins, mas isso é papo pra outro post). Mas depois desse sucesso inacreditável, Latino esmoreceu. Sem emplacar novos hits, foi desaparecendo gradualmente da grande mídia, ficando no limbo por todo o resto da década. Só conseguiria sair desse ostracismo quase que uma década inteira depois. Mas seria uma volta triunfante, um vôo rasante da fênix, ferida e sedenta.

Latino pegou sua mulher na época, Kelly Key, e escreveu um libelo de influência Nabokoviana, tratando da vingança emocional de uma mulher que, quando adolescente, não conseguiu seduzir um homem mais experiente e que agora, já crescida, saboreiava a vingança ao desprezar esse mesmo homem que um dia não tinha se subjugado aos seus caprichos eróticos-juvenis. Baba Baby, o nome da canção. Latino, que deve ser um ávido leitor de Nabokov (e consequentemente, do Dostoievski e do Tolstoi, é tudo ali por perto mesmo), resolveu lançar uma nova e brilhante luz sobre o clássico Lolita: e se o sujeito rejeitasse os avanços da moleca e ela, depois de anos, voltasse e despertasse nele um desejo incontrolável e agora sem as amarras da idade e dos processos penais por pedofilia, mas a garota aproveitasse a situação para empreender uma bela vingancinha, no melhor estilo mulher desprezada? Oras, não seria essa a verdadeira afirmação do ideal feminino, a tênue linha que começa em Eva (para os ateus, em Luzia) e termina na revolução feminista do século XX? Sim, meus amigos. Um insight genial. O sucesso foi estrondoso. Kelly Key saiu das trevas do anonimato para virar uma estrela, e o Latino voltava a colocar suas composições no imaginário popular.
No ano seguinte, Latino se separou da senhorita Key, e resolveu expandir seus talentos para outras freguesias, se é que vocês me entendem. Juntou-se profissionalmente (não existem provas de um relacionamento amoroso entre eles) com a jovem cantora Luka, e escreveu mais uma música que abalaria todas as estruturas do cenário musical brasileiro. Tô Nem Aí. O ideal nilista, a afirmação do indivíduo, o pensamento Nietzcheziano do homem como uma identidade sólida e voltada para a construção do eu e do ego. Latino sentiu que a brutalidade do capitalismo estava sugando toda a individualidade, de uma maneira mais sutil e perversa do que a dos sistemas comunistas-socialistas. Ele não aguentou ver o homem sendo transformado em mais uma máquina, quase um compêndio de sistemas binários e hexadecimais pronto para assumir funções automáticas e efêmeras. Com isso, escreveu essa letra, uma declaração de independência de padrões, rótulos e opiniões alheias. Mais uma vez, Latino entregava ao povo um hit que não só dava calos nos pés, mas sim provocava uma reflexão necessária e, mais importante, fora dos campos de influência inflados e contaminados das universidades e centros de inteligência.


Depois de de dois sucessos que definiram toda uma geração e colocaram o país aos seus pés, Latino poderia ter descansado e contemplado suas criações. Mas não. Homem inquieto, criativo e empreendedor, foi buscar na Romênia, terra de vampiros e empaladores, a inspiração para mais um arrasa-quarteirões. E nasceu uma música furiosa, de mensagem direta e implacavelmente honesta, uma ode às orgias e sexualidades modernas, o homem sem medo do seu ardor sexual, o clamor Nelson Rodrigueano, o sexo como fator de união e congregação: Festa no Apê. O refrão que uniu um país inteiro. Admitimos, finalmente: somos a terra das frivolidades. Carnavais e pecados justificados pela visão de um homem à frente de seu tempo. E pelo terceiro ano seguido, Latino era o dono do país. Depois desses três tiros certeiros, Latino parece ter dado um tempo pra refletir sobre sua posição como músico e artista, no combalido mercado fonográfico tupiniquim. Tenho certeza que ele está, em algum canto do seu amado Rio de Janeiro, planejando a próxima revolução musical. E nós ficamos aqui, ansiosos, aguardando o chamado do nosso mestre de cerimônias favorito. Latino, traga-nos de volta a folia dos seus sons! A atemporidade das suas palavras!

3 comentários:

  1. Bem vc escreve bem e tal...mas tem um erro muito grave no seu post...
    Não era Latino quem assinava as músicas de sua ex esposa...muito menos da música Baba...Essa e quase 100% do trabalho da Kelly é de autoria de Mc Andinho...que é sim um ótimo compositor... (Caetano Veloso pediu uma composição dele em rede nacional)
    Não desmereço o trabalho do Latino não que dentro do que faz é bom, tanto que ganhou um post enorme no seu blog, mas só gostaria de dar o crédito a pessoa certa!

    Abraços

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