domingo, 28 de dezembro de 2008

E esse final de ano ae

The Misfits (Os Desajustados) – não a banda, Google, mas o filme – é lindo. Não como um filhote de cachorro, digo. Faz uns quatro anos que eu queria assistir. Como a gente é bonzinho com as massas, condescendemente confessa que se devem fazer algumas ressalvas. Primeiro que somos cínicos demais e portanto John Huston é para sempre excessivo demais pro nosso gosto. É quase barroco, emocionalmente falando.

As fotos de Cartier-Bresson todo o mundo já conhece, todo o mundo já viu. Mas a gente posta de novo que é gostoso de ver.

E outra, que é menos ressalva que condição para se apreciar o filme como eu apreciei. É preciso gostar muito de mulher. Isto é, ser um homem orgulhosamente heterossexual e amante das mulheres, cheio daquela condescendência típica do machista esclarecido. Machismo esclarecido que é a definição clássica de charme masculino, fineza que o embrutecimento da época eclipsa. (É sempre positivo poder dizer que algo é eclipsado. Parece que tem de ser gênio para usar com pertinência o verbo.)

Arthur Miller era obcecado por Marilyn Monroe e escreveu um roteiro em que tudo é uma metáfora da personalidade de sua esposa. A protagonista Roslyn é uma neurastência que aspira a uma liberdade que de tão vaga é angustiante. E sofre de complexo de salvador e deixa a gente o filme inteiro apreensivo, isso porque somos machos sensíveis. Pobre Roslyn. Como Gable e Clift, vaqueiros no filme, e Miller, marido na vida real, a gente quer salvar Marilyn Monroe, mas não vai dar, não.


Quando Os Desajustados acaba, nada foi resolvido. É o happy end mais enganoso que eu já vi. Todas as personagens são trágicas, as mais trágicas de Hollywood, e era impossível que as coisas terminassem bem, mas terminam. É uma convenção da qual eu não reclamo. Mas me enganaram.

Chamam de filme maldito porque foi o último para Gable e Monroe, mas é na verdade sagaz e exato. Fala de um mundo belo com os dias contados. Que os atores principais tenham morrido em seguida é o terrível do símbolo. Gable sai pra caçar mustangues e assim tentar sustentar um meio de vida insustentável. Não quer ser um assalariado: quer ser livre. Que nem Roslyn. Tudo no filme e no contexto em que foi lançado (extended final da Hollywood charmosa e “ingênua”) trata do que uma vez li perfeitamente descrito como “beleza terminal”.

Essa fala de Roslyn diz tudo (e que linhas seu Miller escreveu!): “Because... we’re all dying, aren’t we? All the husbands and all the wives. Every minute. And we're not teaching each other what we really know, are we?”

Marilyn e os mustangues e os vaqueiros. E a gente fica com cara de macho triste. Aliás, nunca nós machos fomos tão sensíveis e tão tristes.

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