sexta-feira, 19 de junho de 2009

Por que Maria Antonieta é bom

Pelo espírito do Camarada Fundamentalista

(Oi, meu nome é Camarada Fundamentalista. Eu costumava escrever neste blog.)

É bom porque é bonito, poxa. E você pegar o Ancien Régime e fazer disso uma crônica adolescente merece as cinco estrelas vendidas e promíscuas do Pablo Villaça. E o século XVIII é bem indie mesmo.

This is Versailles!

Sei lá quando, mas em algum momento os críticos esqueceram de vez a arte para serem profundos. Foi quando a coisa ferrou mesmo. Daí que você lê resenhas e resenhas de filmes e livros em que a palavra beleza e seus derivados só aparecem entre aspas ou com muitas ressalvas, se não for a própria ressalva. "Apesar de ser bonito", "só é bonito", etc, etc. A ideia de algo "só ser bonito" bastava quando as pessoas tinham alguma sensibilidade ou quando os gostos eram educados e o espírito não era um cheque sem fundo.

Tá, culpa das vanguardas modernistas, culpa do Brecht, que pintaram o filisteu da cultura como aquele arrumadinho todo art nouveau.

Mas antes mesmo de começar o filme, decidi que ia gostar de Maria Antonieta, quando pensei na cara feiosa de todo o mundo que não tinha gostado. Gente que acha que cenografia é coisa de decorador e figurino, coisa de bicha. Gente feia, com os dentes todo estragados, que acha que higiene é coisa de burguês, que beleza é coisa de burguês. No fundo, essa gente é que é o próprio burguês, o único que existe hoje em dia como categoria estética, dos sem-gosto. Isso me leva ao ponto deste post, a saber: da necessidade do Ancien Régime e de filmes sobre o Ancien Régime. Com a morte de Luís XVI, meus filhos, veio a democratização da arte, esse negócio chamado cultura, com gente falando cuspindo na nossa cara.

Kirsten Dunst de Maria Antonieta ficou bem fofa, faz odiar a Revolução Francesa. E olha que eu gosto da ideia de armar barricadas, botar fogo em tudo e cortar cabeças ocas. Mas no fundo, a voragem assassina que conduz à guilhotina é alimentada por um espírito extremamente aristocrático. Afinal, trata-se de um privilégio. Cortar cabeças é o tipo de privilégio que a plebe criou assim que descobriu, ou coisa parecida, que a nobreza não podia ter privilégios, que era errado (sic), afinal todos os homens são iguais etc e tal. Mas o que seria do mundo se não houvesse privilégios? Emprego, mulher bonita, títulos dos mais variados tipos, tudo o que se faz se faz exclusivamente para alcançar algum privilégio, que é aquela posição na qual você pode dizer "eu tenho, mas você não". No caso, "Maria, eu tenho cabeça, e você não". Na autoajuda, é a vontade de se sentir especial; na autoajuda e nos cartões de feliz aniversário com o Snoopy.

Ai, que saudades de quando era indie ser indie...

O privilégio é a fina flor das instituições, o sentido profundo do poder, o estado a que toda experiência com a beleza conduz. (Se exalta.) Imagine você, espinhento e meio tonto, tendo que ler um livro, em vez de desfragmentar seu HD, poxa, qual a graça da vida? Pois a graça da vida está em resmungar, todo espinhento e meio tonto, que pelo menos "eles" não conhecem a verdadeira arte de um casemod da Enterprise. Um privilégio, criança.

Mas eu fico com Kirsten Dunst e trilha sonora 80’s very cool mais figurino e cenografia deslumbrantes, ai, sim, deslumbrantes. "Quer escrever deslumbrante, escreve, mas depois se mata, bicha, se mata" (Manual de Estilo do Estado de S.Paulo, p. 86). E onde mais a gente vai ver nobres franceses se empanturrando de docinhos e dançando ao som de Siouxsie and the Banshees?

Então, repetindo: filme bonito é bom. Punkt.

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