quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Nosotros fuimos al cine

1 O fantástico Senhor Raposo estreou sexta passada por aqui, mas nós já tínhamos visto durante a Mostra numa sessão muito especial porque contou com a presença de Pablo Villaça. Foi preciso controlar meu acompanhante, que teve acessos de tiete. Gostamos muito. A estética e o humor de Wes Anderson encontraram seu lugar na animação. É seu melhor filme desde Os excêntricos Tenenbaums, que vocês devem imaginar que é dos meus favoritos. Uma tarde dessas, assisti o Senhor Raposo uma segunda vez com uma amiga do serviço e ela dormiu a maior parte do filme.

2 Também vi, com a amiga mencionada, Cidadão Boilesen, um filme necessário. Cidadão Boilesen, um filme necessário, é um documentário sobre Henning Boilesen, que dá seu nome a uma rua na zona Oeste da capital e foi presidente da Ultragás nos anos 1960. Era dinamarquês e se mobilizou, junto ao empresariado paulistano, para patrocinar a tortura na época do regime militar. Chegou a participar de sessões muito privativas no clube DOI-Codi, convidado especial do coronel Brilhante Ustra, que também conta sua versão da história. O nome de Sergio CAMARGO CORRÊA também é citado, além, é claro, da Folha de S.Paulo como empenhados patrocinadores da tortura. E muitos outros que não ousam dizer o nome, mas que estão por aí alegres a cantar, como afirma um militar reformado, também entrevistado. Um filme necessário.

3 E ontem mesmo vimos uma sessão tardia de Um namorado para minha esposa, espécie de Se eu fosse você argentino, sem o histrionismo e o mau-gosto que só Daniel Filho e grande elenco podem fazer por você. Noveleiro que é, Daniel Filho não está cometendo nenhum crime, mas dando o que o povo quer. Mas, como eu e você nos achamos mais que povo, fiquemos com o cinema argentino, sensível e contido, mesmo ao mostrar que nuestros hermanos son más bregas que nosostros. Inclusive endosso quem diz que espanhol é só um português ridículo. Pantalones e preguntas é que não me desmentem.

4 E falando em cinema nacional, discutimos os problemas da maior parte da produção atual (e desconfio que da passada, como também da futura) e identificamos uma causa principal, chamada Fator Clóvis Bornay. Trata-se do exagero e da pompa que marcam e que, na maioria das vezes, deformam qualquer expressão cultural no Brasil. Foi descoberto enquanto víamos, aos risos, o trailer de Ouro Negro, filme com Danton Mello sobre a fundação da Petrobras. Siiiiim. O projeto obviamente exigia uma superprodução para a qual, no entanto, faltava orçamento. Resultado: overacting, que na cabeça dos atores brasileiros compensa o déficit épico da mise-em-scène pobretona, e efeitos especiais de Trapalhões, rendendo uma grande sessão de humor involuntário. A estrear.

5 The Conversation, um Coppola de 1974, é provavelmente melhor que Apocalypse Now, mas esse é o tipo de controvérsia que não me interessa criar quando o barco já está afundando. Mas é outro FILMAÇO que assisti nesse interlúdio gostoso longe de vocês. Procurem pela internet, porque não foi lançado nem em VHS, nem em DVD, entrando numa longa lista de títulos essenciais que aguardam a boa vontade das distribuidoras, que precisam lançar antes edições comemorativas de Vovozona para aquecer o mercado, ui.

6 Li também muitos livros, porque os blogs que eu acompanho deixaram de ser atualizados. Aparentemente blogueiros entram em “crise criativa” ou “se cansam do formato”. Tudo se passa como se estivessem escrevendo Anna Karenina. São divas que perderam a hora da pedicure. Recomendo Lady Macbeth do distrito de Mtzensk, uma novela russa em que muita gente é assassinada e você sente que é o próximo. Das melhores coisas que li. E esta passagem aqui de um texto da jornalista Vanessa Barbara, porque de repente dei pra citar texto de jornalista: “O tempo corria para trás nas aulas de francês do mosteiro São Bento – como se fosse sempre à tarde e nós usássemos chapéus.” Sei lá, posso andar sentimental, mas esse “como se fosse sempre à tarde” me pareceu tão bonito quanto um haicai sem ser. Grato.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Fomos ao Cinema ver Coco Antes de Chanel

Se você for uma pessoa daquelas que jamais ouviu falar em Coco Chanel (que baita Mané você é, hein? Com todo o respeito), e colocar os seus olhos nesta produção francesa, sairá depois dos 115 minutos de projeção achando que a Senhorita Coco era uma chapeleira de quinta, daquelas que vão em lugares de alta classe empurrar as suas criações para as abastadas clientes, e que se apoiava em um punhado de ricaços para se sustentar, e que mesmo depois de se consagrar, era uma infeliz que tinha virado as costas para o que, pelo menos segundo o filme, realmente importa para as mulheres: o amor.

O filme, que deveria, caso fosse uma produção de sucesso, transmitir para o espectador o tamanho da influência da francesinha não só no mundo da moda, mas também em toda a sociedade no século XX, e o seu papel fundamental no que viria depois a ser chamado de emancipação feminina, prefere se concentrar em um dos fatos mais desinteressantes e aborrecidos da vida da estilista, partindo de uma presumpção equivocada a respeito da influência que os eventos tratados no filme tiveram ou teriam tido sobre Chanel. Mas tem dia que parece que é de noite, como diria o meu avô, e o que temos é uma produção cachorrenta, vira-lata, vagaba e safada, que desfila atuações frouxas e sem energia, que em nada são ajudadas pelo roteiro pouco flexível. Audrey Tatou, que lembra vagamente as feições de Coco, tenta trazer alguma energia ao filme, mais peca pela caracterização rígida demais. Os momentos de felicidade vividas pela estilista, principalmente quando “descobre” poder amar também, são traduzidos para a tela por Tatou com um desconforto inquietante, o que revela até uma certa preguiça por parte da nossa Amelie (será que o semblante cada vez mais rígido de Audrey nos filmes é culpa do seu descontentamento por ter sempre que ouvir comparações cretinas com a sua personagem mais famosa, de incautos como eu?), que não encarna Chanel com a mesma energia que Marion Cotillard empregou na sua Edith Piaf.

Chapeleira Louca, antes de Depp

Dizem por aí que o filme é soporífero e pouco elucidativo (termina em 1919, ainda com Coco longe do seu auge criativo, e longe das perrengas encaradas pela estilista na Segunda Guerra) por culpa da estratégia de lançamento, já que promete-se um “Coco Depois de Chanel” para os anos subseqüentes, que revelariam a segunda parte da história. Como não encontrei fatos mais substanciosos sustentando esta tese, acredito que não veremos a segunda parte, já que este filme não foi lá o maior sucesso da França para merecer mais uma produção. E se viesse, caso fosse com o mesmo time incompetente no comando, e com atuações tão esculhambadas como as vistas aqui, que não venha nunca mesmo.

A diretora do filme, Anne Fontaine, que faz aniversário 2 dias depois de mim (15 de Julho, nós poderíamos dar festas nervosas juntos, com uns videogames em rede, Nintendinhos e tudo mais, e uns hamburgeres e suco de Uva pra galera matar a sede), tem créditos ESTONTEANTES no currículo, que inclui filmes como.... e como.... e tem também aquele outro, o....er..... xápralá. Aparentemente o Luc Besson estava ocupado demais para o cargo, o que configura basicamente o cenário ideal para o fim dos tempos.

Coco Antes de Chanel é um dos filmes que mais desrespeita o seu alvo que eu jamais vi, e não por pintar a sua protagonista com cores pouco agradáveis, e sim por ser um filmeco que empalidece perante a inesgotável influência existente na vida de sua personagem. Chego a achar até que Anne Fontaine se ressente da influência de Chanel, já que praticamente joga no lixo as conquistas da mulher, e as poucas que demonstra faz questão de diminuir ao apostar conseguir interpretar a psique do mito, trazendo a estúpida questão do amor perdido à tona. Por isso que eu digo: antes ler sobre a Chanel na Wikipedia do que morrer com 20 pilas vendo essa porcaria.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Fomos ao Cinema ver Amantes, Paris, Uma Prova de Amor, Se Beber Não Case, Distrito 9, A Verdade Nua e Crua e Novidades no Amor

É sério isso, cambada. Esses foram filmes assistidos por mim nos últimos tempos. Eu deveria ter falado sobre todos eles, mas, por motivos desconhecidos e que provavelmente envolvem até pitadas sobrenaturais, eu acabei falhando em trazer aqui os textos sobre os respectivos, e vou tentar recuperar o tempo perdido. Eu sei, é um absurdo, uma falta total de respeito com vocês, blá, blá, blá. Mas se vocês me perdoarem, eu prometo mandar fotos minhas jogando tênis na última viagem que fiz. É só vocês escreverem pedindo para o seguinte e-mail: cfundamentalista@gmail.com. O nosso Camarada não se importa com o incômodo, e tem todo o tempo do mundo para responder os e-mails enviados por vocês. Opa, opa, opa, talvez role até uma comigo bebendo uma dose de Margarita. Irc! Ocaso do futuro bem marcado em cartas de tarô!


Fomos ao Cinema ver Amantes

Amantes é um filme pretensioso, um estudo de personagem lento e reflexivo. O filme peca pelo roteiro pouco inventivo e corajoso, o que acaba jogando a sua trama na vala comum dos dramas românticos, mas merece elogios por não acelerar a sua narrativa e nem descuidar do tratamento dado aos seus personagens. O diretor James Gray ( Pequena Odessa, Os Donos da Noite) merece atenção, embora já esteja no ramo faz um tempinho (Pequena Odessa foi lançado em 94, quando ele tinha apenas 21 anos). No mais, Joaquin Phoenix é um excelente ator, e deveria parar com essas micagens de querer ser rapper e tudo mais e voltar a se concentrar no que sabe fazer, embora tenha dito que esse filme seria o seu último. Deixa de ser moleque, rapá! Os rapazes podem gostar da pior cena do filme, que tenta em um forçado toque de vanguarda européia mostrar ousadia ao revelar os seios desnudos da já milf Gwyneth Platrow (juro pra vocês que eu já tinha esquecido dela), no melhor estilo O Expresso do Oriente. Juro pra vocês, a cena remete a uma das mais famosas daquele filme.


Fomos ao Cinema ver Paris

Cedric Klapish, um francês cheio de ginga e malandragem, deu ao mundo dois filmes que são venerados pelos posers e deslumbrados da cena alternativa paulistana: Albergue Espanhol e Bonecas Russas. Tendo viva na memória os momentos tediosos que passei quando assisti a esses filmes, resolvi encarar uma sessão do mais novo engodo do cineasta. Paris é mais uma dolorosa mostra do universo equivocado e pouco interessante criado pelo cineasta, que joga uma trama frouxa e sem qualquer resquício de energia em intermináveis 130 minutos. Contando diversas histórias paralelas, o filme conseguiu a proeza de não me fazer se importar com nenhuma delas. Na verdade, o personagem que mais me causou comoção no filme fui eu mesmo, e o meu sofrimento ao aguardar pacientemente o fim da projeção, com dores no joelho (torci jogando bola ai, doeu pacas, mó tristeza) e tudo mais. Mas no final das contas sai com uma impressão válida ao menos: Juliette Binoche, com gloriosos 45 anos, ainda bota muita garotinha no chinelo.


Fomos ao Cinema ver Uma Prova de Amor

Nick Cassevetes é filho do mito John Cassevetes. Só por isso, deveria ser cuidadoso e dirigir filmes que fizessem jus ao sobrenome que carrega nas costas. Mas aparentemente o pequeno Nick está pouco se lixando. Uma Prova de Amor é o filme mais manipulador que eu já vi na minha vida. Com cinco minutos de projeção já está querendo levar os seus espectadores (leia-se mulheres) às lágrimas, e segue nessa toada infernal até o seu derradeiro minuto final. A trama por si só já traz o alerta de “perigo: água com açúcar à vista” por toda ela, contando a história de uma família cuja filha mais velha tem leucemia, e que usa a irmã mais nova dela como doadora constante, uma prática absurda e que poderia gerar um interessante drama com explosivos conflitos morais, mas que bizarramente é deixado de lado em nome das lágrimas fáceis. Cameron Diaz já está pronta para a vala comum das quarentonas de Hollywood, e Abigail Breslin consegue fazer a experiência ser menos massacrante com sua graça natural. Assustadoramente, uma das melhores atuações do filme é do canastra-mor Jason Patric. Imagino o velho John, cujos filmes eram marcados por narrativas classudas e corajosas, assistindo a essa porcaria. Ia querer dar uns belos e merecidos croques na cabeça do filho. Por isso que eu digo sempre: jamais tenham filhos.

Fomos ao Cinema ver Se Beber Não Case

Hollywood está tomada pelas chamadas bromedies, comédias que mostram grupos de amigos já beirando os 40 anos e que apresentam conflitos de maturidade e dificuldade em aceitarem as responsabilidades da vida, o chamado Arrested Development. Judd Apatow é considerado o pai do gênero, embora eu, Progressista, o filho predileto de Rajneesh, considere o marco zero do gênero o filme Dias Incríveis, de 2003, que foi dirigido pelo Todd Philips e tinha o Vince Vaughn, Will Ferrel e Luke Wilson no elenco. Se Beber não Case também é dirigido por Todd, e foi o sucesso mais inesperado do verão americano, gerando inacreditáveis 250 milhões de dólares nas biheterias, além de ter causado boas impressões nos críticos. A trama é redondinha, apostando em um bem amarrado clima de mistérios e surpresas para arrancar risadas dos espectadores. O maior mérito do filme é não amenizar a sua narrativa em nenhum momento, carregando em um humor rude e corajoso em tempos politicamente corretos. Mas não sei se é uma boa coisa quando o maior mérito de um filme é ele encarar de frente a sua vulgaridade. Teria de pensar sobre isso. Vou passar um mês em um retiro espiritual pensando sobre isso, e trago no fim a resposta para vocês.


Fomos ao Cinema ver Distrito 9

Filme que causou comoção quando lançado na gringa, sendo cogitado para o Oscar e tudo mais. Feito em formato de mockumentary (se você não sabe o que é isso, ô burraldo, significa que é um documentário falso. Lembre de produções como Spinal Tap e séries como o The Office, mané), é um dos filmes mais brutalmente energéticos que vi nos últimos tempos. Apostando no climão “realidade nua e crua com favelas e violência”, popularizado pelo coisa nossa Cidade de Deus e visto até me produções como Quem Quer Ser Milionário? nos últimos tempos, é uma fábula sobre o Apartheid sul-africano, mostrando um grupo de alienígenas cuja nave-mãe acabou ficando suspensa no céu de Johannesburgo, e que é discriminado socialmente e legalmente pela sociedade sul-africana, em algo que remete à revoltante situação enfrentada pelos negros nos tristes 30 anos de Apartheid. O diretor Neill Blomkamp é nativo de Johanesburgo, e conta a história lembrando-se dos fatos por ele presenciados em sua infância na cidade, assistindo àquela realidade horrorosa como espectador privilegiado, já que era morador das chamadas zonas brancas (blergh!) da cidade. O formato do filme e a sua sufocante atmosfera (realçada ainda mais pelo formato, que capta a energia da narrativa de maneira eletrizante) são um sopro de ar no combalido universo das ficções científicas do cinema, assolada nos últimos tempos por tramas nada estimulantes e com temas cansados e batidos. Mérito também do diretor na descoberta de Sharlto Copley, amigo de infância que, a pedido do diretor, assumiu o papel principal do filme. Nenhum ator badalado traria o pulso que Copley emprega na sua atuação.


Fomos ao Cinema ver A Verdade Nua e Crua

Um dos piores filmes que eu vi em toda a minha vida. Um festival de oligofrenias, obscenidades e dubialidades morais. Se eu fosse ator e lesse um roteiro desses, eu iria me esconder embaixo da cama por meses. Mas aparentemente Gerard Butler e Katherine Heigl (que as meninotas devem conhecer da horrenda série Grey's Anatomy) não têm exatamente muita vergonha na cara, e embarcam nessa bomba com gosto. No mais, Butler achou que estava no set de 300, e atua exatamente da maneira como fez naquele filme homoerótico. Cheguei até a esperar o momento no qual ele gritaria no ouvido de Katherine o famoso “THIS IS SPARTA!”, tal o tom equivocadamente gutural que ele deu para a sua atuação. Já Katherine, que é a cara da Rachel McAdams, é obrigada a desferir alguns dos diálogos mais vulgares jamais conferidos a uma dama em uma produção mainstream hollywoodiana. Mas como eu disse antes, vergonha é pra quem tem, obviamente. Se o Framboesa de Ouro ignorar esse lixo, eu vou ficar meio que bravo.


Fomos ao Cinema ver Novidades no Amor

Filme que, de tão bom, nem foi lançado em circuito no mercado americano. Catherine Zeta-Jones precisa demitir urgentemente o seu agente, e Justin Bartha tem me perseguindo incessantemente, já que o vesguinho (que maldade!) também estava no Se Beber Não Case. Acho que, se eu fosse ele, procuraria não ficar no mesmo espaço que o Michael Douglas por muito tempo. Umas passadas de mão nervosas ai, moro? O moleque conferiu com gosto tudo o que a quarentona e ainda divina Zeta-Jones tem para oferecer. Que coisa... De resto, o filme não é engraçado, não desenvolve os seus personagens suficientemente para que nos importemos com os seus futuros, e aparentemente não sabe como resolver a sua narrativa, apostando em um final preguiçoso para juntar as pontas. Para falar a verdade, eu mal lembro qual foi a história contada pelo filme, tive que fazer um baita esforço mental para conseguir relembrar os detalhes contados pela história. Acho que ninguém envolvido nessa produção deve lembrar de muita coisa também. Se não me falha a memória, era um musical sobre um grupo de coristas na Chicago dos anos 30, que alcançavam a fama de maneira bizarra quando eram presas por algum crime que cometiam, e eram defendidas por um advogado charmoso e que dançava também. Acho que era isso.
Ufa! Só para terminar dizendo que eu vi também o Bastardos Inglórios, e pretendo fazer um texto sobre ele em breve. Texto que poderá ser o canto de cisne do.... (a sua conexão caiu, reinicie a sessão).

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

O bom, o mau e o bobo

Bastardos Inglórios é um filme do Tarantino. Não há dúvida, assim como A Prova de Morte e Kill Bill. Agora, saber se Pulp Fiction e Cães de Aluguel pertencem ao mesmo diretor, ao menos, merece uma explicação para fazer tal afirmação.

Cães de Aluguel foi pé na porta de um atendente de videolocadora no mainstream de Hollywood. A trama é simples: quando um assalto dá muito errado; a trama se desenvolve, pois e somente, num galpão velho onde vemos os diálogos transcorrerem rapidamente, como também magistralmente. Um porra de um galpão se desenrola um bom filme. Simples, sem muitos exageros e nem fala espertinhas: assim como uma boa piada: rápida e, porque não, rasteira.

Sua segunda direção foi Pulp Fiction, filme que impressiona pela montagem. Um filme pode ser definido em três elementos: roteiro, direção e montagem. Dessas diretrizes e das suas relações pode-se fazer um bom filme ou concorrer a uns prêmios Framboesa. Pulp Fiction abusa e utiliza da montagem a seu favor. Apresenta uma boa história, sim; direção de um novato bem executada e engraçadinha, sim; mas é na montagem que o filme se define e revela sua beleza, Cannes percebeu isso, assim como todos aqueles que costumam citar quando lembram de Tarantino.

Parla! Pero no mucho.

Taranta teve outras empreitadas, onde o roteiro era a peça fundamental do filme: Assassinos Por Natureza e True Romance. Assim como Cães de Aluguel histórias bem amarradas onde a trama é bem desenvolvida e o clímax bem executado.

Temos dessa forma uma mudança nos filme dele: primeiro se priorizou o roteiro; em um instante depois a montagem, qual seria a evolução? Logicamente os leitores adivinharam, a porcaria da direção e todos os seus filmes tributos oriundos dessa fase. A partir de Jack Brown, ele se apoiou em uma sólida direção que trabalha todas as suas influências misturadas em uma única embalagem.

Jack Brown foi o seu filme blackexplotation mal executado: pegou o pior de todos os filmes da década de setenta e reuniu de uma só vez, ainda acho que Jackie Brown foi dirigido por um quarto do cérebro dele, algo tão ruim, mas ruim. Kill Bill é uma mistura de kung fu com wester spaguette. Divetido, plástico. Mas fica por aí. Muito bom, mas quando comparado aos seus trabalhos iniciais ele parece um tanto regular. Não gosto de falar de A Prova de morte, filme bizarro e pronto.

Continuando sua senda, onde há valorização da direção, temos Bastardos Inglórios: tributo a Segunda Guerra e a Sergio Leone. Antes vi que todos os críticos elogiavam essa nova película, TODO lugar que li algum rascunho de crítica rasgava seda para Bastardos Inglórios. Não gosto de ser diferente, só porque todo mundo fala bem, logo eu blogueiro, vou falar mal? Resolvi assistir o filme novamente e ainda assim não me surpreendeu, não é um filme ruim, entretanto até quando Quentin Tarantino ficará preso na sua obsessão por direção, obsessão boba: Um bom roteirista que fez miséria na edição, se prende nesse tipo de direção, até quando?

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Fomos ao cinema ver Bastardos Inglórios Vol. 1

(aka The 209th Post by Camarada Fundamentalista)

Bastardos Inglórios é filme pra quem gosta mesmo de Tarantino. Gostar mesmo de Tarantino tem a ver com baixar as trilhas sonoras dos filmes dele e ser burrão de achar Kill Bill melhor que Pulp Fiction. Já não gostar mesmo de Tarantino deixa ver que Pulp Fiction nem é do Tarantino. Pulp Fiction é bom demais pra ser do Tarantino. Muita gente, inclusive eu, faz campanha pra que Pulp Fiction não seja do Tarantino. Pra que seja do Robert Zemeckis. Ou do Cameron Crowe. Ou do Robert Redford. Ou pra que volte a ser do Danny DeVito. Tudo menos do Tarantino. Pode ser até do Liev Schrieber. Só tira pelamor o nome do Tarantino dos créditos. É que Pulp Fiction criou um mito. Criar mitos é a segunda pior coisa que pode acontecer no mundo do cinema, e acho que da literatura, se eu lesse livros. Só perde pra ressuscitar carreira de astro decadente. Tipo John Travolta ressuscitado em Pulp Fiction graças ao diretor Danny DeVito pra depois produzir A Reconquista, eeeeeeeee. Esse mito se chama Quentin Tarantino.

Mas Bastardos Inglórios pode ser do Tarantino. Faço questão de que todo o mundo saiba que Bastardos Inglórios foi escrito e dirigido por Quentin Tarantino. Porque Bastardos Inglórios tem 150 minutos. Porque Bastardos Inglórios tem uma cena em que a cara do Hitler é metralhada até virar pudim. Porque eu saí do cinema mais preocupado com a cara do Hitler transformada em pudim na base do tiro que com a intertextualidade. Porque teve muito neguinho crítico de cinema que deu cinco estrelas pro filme por causa da homenagem a toda a porcaria da história do cinema. E eu acho muito bom as pessoas homenagearem toda a história do cinema. Mas o cara não pode fazer isso só porque acha que dirigiu Pulp Fiction. Porque quem dirigiu Pulp Fiction foi o Danny DeVito. Aquele gordinho baixinho e careca.

Três fãs do Tarantino me esperando na saída do metrô.

E o problema é que quem gosta mesmo de Tarantino acha que ele é tipo o Messias. A história toda do cinema convergindo nele. E o pior é que o Tarantino acha mesmo que é o Messias. Senão não fazia um filme que faz convergir em si a história toda do cinema de um jeito todo atrapalhado. E todo o mundo acha o Tarantino um cara muito doido. E deve ser mesmo. Mas fazer pudim da cara do Hitler é uma coisa que ainda me choca. Apesar de muita gente me responder na hora que, pô, é um filme do Tarantino. Então tá. Só que eu fico chocado. Mas não com todo o mundo olhando. Fico chocado e quietinho. Pode me chamar de filisteu. Pode me chamar de tonto. E eu acho que alguém devia apresentar o Tarantino a um ser humano de verdade. Não ser humano de filme de luta. Ser humano ninja. Tarantino, esse aqui é o ser humano. Ser humano, esse aqui é o Tarantino. Porque tem gente que morre em Bastardos Inglórios, e a gente não está nem aí, gente que devia morrer com a gente gritando pelamor não mata ele, não mata, ahhhhhhhhhh.

Eu não sou fã do Quentin Tarantino a ponto de achar Kill Bill, os dois volumes, o máximo. Achar Kill Bill, os dois volumes, o máximo é coisa de adolescente que quer ser cineasta quando terminar o Ensino Médio daqui a dois anos. É o sujeito que lê O Guia do Mochileiro das Galáxias hoje, aos 15, e acha o melhor livro do mundo, e vai ler O Guia do Mochileiro das Galáxias aos 45 e ainda vai achar que é o melhor livro do mundo. Porque Kill Bill é bem legal e tudo. Mas é fase. Eu tive a minha. Assobiei a musiquinha. Comprei a caixa The Box Deluxe Sweet Child of Mine Edition. Curti a Uma Thurman. Namorei uma japinha com cara de protagonista de filme de terror japonês e chamava ela de Gogo. Dei até com uma arma mortal na cabeça dela. Comprei um macacão amarelo e um tênis de alpinista amarelo. Fui pra Liberdade atrás da japonesada pra lutar e tudo. Etc, etc. Mas, sei lá, passou.

O filme é tipo meio que a história de uma menina e um cara que tipo persegue e não persegue ela, mas não é nada pessoal. Aí a menina foge, e o cara continua perseguindo outras pessoas enquanto ela não aparece, mas aí quem aparece são os Bastardos Inglórios, que tipo não têm nada a ver com a menina, porque eles nem conhecem ela, e tal, mas o cara meio que conhece os Bastardos, que também perseguem uns caras, no caso os nazistas, e, ah, a menina é judia e tudo. E tem aquela mesma estrutura em capítulos dos dois Kill Bill. Mas mais preguiçosa. Uns enquadramentos classudos. David Bowie. E eu queria que o Tarantino voltasse a ser objetivo como em Cães de Aluguel.

Bang bang, she shot me down.

Isso até me lembra de outro dia quando um amigo meu me perguntou sobre o que é que era Kill Bill, que o extraterrestre não tinha visto. Aí eu disse que era tipo meio que uma paródia, mas mais do que isso, de filmes de artes marciais. Mas aí eu vi que dizer que era tipo meio que uma paródia de filmes de artes marciais não convencia muito de assistir o filme como eu queria que ele assistisse. Mesmo que fosse mais do que isso, de filmes de artes marciais. E aí eu continuei falando que tinha uns lances de câmera que ele ia perceber de cara porque o negócio era bem filmado e tudo. E uns enquadramentos e tal por ser bem filmado e tudo. E aí ele se convenceu e disse que veria um dia. E aí eu fiquei satisfeito e aliviado. Nem sei por quê. Acho que não queria parecer burro.

Bastardos é uma sátira de guerra. Isso porque tem o Hitler falando cuspindo meio histérico. Como é uma sátira de guerra, as pessoas vão logo lembrar de Doutor Fantástico. Mas pomba! Doutor Fantástico não foi dirigido pelo Tarantino. E não é qualquer guerra. É a Segunda Guerra Mundial. Mas a verdade é que o Tarantino passa que nem um trator por cima disso. Porque podia ser sobre qualquer guerra. Qualquer coisa. Podia ser sobre a guerra da Indochina. Podia ser sobre a Escola de Sagres. Que dava na mesma. Tudo porque é um filme do Tarantino. Com um carimbo gigante na testa dos atores e nas cenas dizendo Tarantino’s movie. E tem também um gordo que nem dizem que querem que a gente ache que é o Churchill. Mas é. E o Mike Myers na mesma sala com esse gordo que deveria ser o Churchill. O que é muito inverossímil. Porque o Churchill nunca ficaria na mesma sala com alguém como o Mike Myers. O Mike Myers que é o, er, astro decadente da vez a ser ressuscitado. Mas sinceramente acho que não vai rolar. E eu acho que o Tarantino devia logo refilmar Era Uma Vez no Oeste do jeito que o Gus Van Sant refilmou Psicose. Aí ele parava de enfiar Sergio Leone goela abaixo da gente, que é bem legal e tal, mas pô.

Agora meu TOP 5 dos filmes do Danny DeVito:

5. Morra, Smoochy, Morra
4. Matilda
3. Hoffa
2. Pulp Fiction
1. Era Uma Vez no Oeste

sábado, 10 de outubro de 2009

joaquimnabuco.wordpress.com

Este post sofreu o patrocínio da Monsanto Company.

O que a sabedoria manda fazer? Nunca confessar que se gosta de Los Hermanos gostando-se de Los Hermanos. Não discordar dos amigos em pontos que envolvam paixões virulentas. Afastar-se diante de paixões virulentas. Evitar paixões virulentas. Esconder paixões virulentas.

Mas hoje estou particularmente preocupado com generosidade e com os empecilhos para sua prática. Pois, como todas as outras virtudes, ser generoso não é talento, mas ação. Direto e reto como os bons comunicadores, vou dizer o que penso. Acho que o principal obstáculo para a generosidade é o detalhe. Deter-se nos detalhes.

Em estética, isso é fundamental. Dizem que o gênio está nos detalhes. Obras de arte são invariavelmente um acúmulo absurdo de detalhes, resultado da preocupação maníaca do artista com detalhes. Pensem num quadro. Pensem num livro. Não, O estrangeiro, não. Pensem em A educação sentimental. Remeto-me ao cancioneiro popular: “Quando Deus te desenhou, ele tava namorando”. Escrevam-me suas conclusões.

Mas, moralmente, o detalhe amesquinha. Estranho, não? Não, nem um pouco. Estética e ética são dois ramos do cerumano onde o lóbulo frontal e o dianteiro diferem. Aqui tem um esquema:

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Woody Allen me ensinou que é possível driblar a percepção de uma pequena multidão se apelarmos para as conhecidas pretensões intelectuais. Retrospectivamente falando, foi o que fi-lo quando citei A educação sentimental em detrimento de O estrangeiro. Se tivesse dito Tolstoi, o efeito diminuiria, porque não o tendo dito supus que sabiam que foi Tolstoi que escreveu A educação sentimental. Formou-se, metaforicamente falando, um pequeno clube, e a chamada cumplicidade autor-leitor foi estabelecida. Agora piscarei meu olho esquerdo, quero que o imaginem: Flaubert, Flaubert, Flaubert.

Mas isso ainda é o detalhe. Cinematograficamente falando, volto a Woody Allen. Dizia eu que ele fez algo que, a título de ilustração, mostra que a estética se fundamenta na ética. É o liame diáfano do raciocínio. Mas ó, atenção, que dá pra entender. Sem um posicionamento ético – testa no chão, tronco num ângulo de 45º em relação ao mesmo chão, pé esquerdo tocando a base da nádega e perna direita recolhida junto ao estômago – que releve o detalhe, qualquer empreendimento estético no sentido de produzir detalhes (já que é essa a natureza estética par excellence) gorará. Sim, senhores, temo que gorará.

Por exemplo Woody Allen ter filmado Manhattan, que é lindo, com Gershwin logo de cara, fotografia p&b maravilhosa e citações eruditas a cada cinco linhas de diálogo (rate fornecido pelo AFI Crazy Nuts Quotations Index). Tudo pra dissimular o fato de que Woody Allen era um judeu baixinho de 42 anos dating uma Mariel Hemingway de 17 anos. Premissa doida do caramba.

(Anatomicamente falando, prevejo dificuldades para entender o que seja a base da nádega. Ora, nada mais que o ponto em que se encontra a dita coxa com a sobredita polpa.)

Mas a audiência vulgo nós bate palmas porque funcionou graças ao fato ético de havermos esquecido detalhes como as conveções sociais sobre beleza, atração sexual e lógica clássica e acreditado na ilusão dramática de que o amor pode tudo. Os filmes do Woody Allen são sobre isso, não são? Quase todos os filmes são. Mas há filmes que falham justamente em embasar detalhes de ordem estética com a ausência de detalhes de ordem ética, compreende? Aqui cumpriria falar de Bastardos Inglórios, que era de fato o meu objetivo. No fundo da coisa toda, estava um filme de Tarantino, este gênio contemporâneo. Convém preambulá-lo.

Muita gente se engana ao dizer que Quentin Tarantino é o exato oposto de Glória Kalil, que, conforme sua descrição pessoal no twitter, é uma “jornalista, empresária e consultora de moda brasileira”, que se dedica “à consultoria de estilo e negócios ligados ao campo da moda e do comportamento”. E, a propósito, a minha descrição é: “um colchonete entre colchonetes”, que na época achei muito espirituosa. E ainda acho. Mas, praticamente falando, Quentin Tarantino e Glória Kalil são praticamente a mesma pessoa quando percebemos que ambos são interessados em estilo. Agora uma palavra sobre estilo.

Clodovil ou Pedro Bial, talvez os dois, não sei ao certo, disse que “O estilo é o homem” ou "O estilo é homem". Se a frase é do Clodovil, tendo à segunda opção. Ora, eles estão estão certos. Porque o estilo é isso aí. Mas o estilo é também a coisa mais perigosa do mundo quando priva o homem daquilo que ele tem de mais precioso: a vontade de construir um mundo melhor. Quer dizer, escrever certo por linhas tortas. Isto é, ser feliz ao lado de quem se ama. Trocando em miúdos, ganhar muito dinheiro e namorar modelos ajudando a comunidade.

O estilo pode ser o homem, mas também pode ser o que mata. E o que mata o homem.

Um soco no estômago da mesmice do consenso.

Este post sofreu o patrocínio da Monsanto Company.

Aos 7 anos, eu já catava lixo na rua pra ter um futuro melhor, cursando Letras e me apaixonando por você (coloque o seu nome aqui:_________). A nossa trajetória é uma história de desafios. A mesma de Tarantino. Nossos pais não nos liam Baudelaire à mesa de jantar. Nós nem tínhamos uma mesa de jantar. Nem posso imaginar mamãe, com sua sensibilidade romântica, fazendo vômito ao ouvir o lirismo da carne putrefeita da amada do Poeta. O saldo de nossa (de)formação é que hoje gostamos de cantar junto. E o critério de Tarantino é um só: fazer filmes que ele gostaria de ver. (Vide lista dos filmes favoritos de Tarantino nos arquivos imundos deste blog.)

É inegável que Tarantino é um exímio. Mas será que ele tem algo a dizer? Pois será que nós mesmos temos algo a dizer e, por que não dizer, a ouvir? Encerro aqui, deixando estas perguntas aos senhores, que espero meditarem com escrúpulos redobrados na clausura de suas cabeças.

Este post sofreu o patrocínio da Monsanto Company.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Vivre sa vie

Prometem demais pra gente com esse lance todo de amor. Quando é a nossa vez, pra valer, nos decepcionamos pra vida inteira. Divórcios são só o mais comum, mesmo entre aqueles que não aprova(va)m. Trata-se de uma geração terrivelmente mal preparada para se sacrificar, para admitir que a vida não é curtição, Coca-Cola, etc e tal.

Quer dizer, na maior parte do tempo estaremos só tranquilos, depois entediados, aliás muito entediados; e se não estivermos entediados, então será um inferno e estaremos à procura de paz, porque alguém ou alguma coisa nos enche muito o saco, talvez nos atormente mesmo. É, a alternativa será essa, ou tédio, ou perturbação. Mas às vezes felicidade, pura e simples, algum sucesso, aquela sensação de triunfo, que tem de ser ocasional, e depois a morte. As vidas são assim, todas iguais, e pelo que eu sei não mata, ou quase.

Frustrar-se é inevitável, os mais sensíveis se frustram por completo, terminando amargos; e quem diz que não é frustrado, é conformista, talvez cínico, talvez conivente. “O mundo está contra nós” é papo de adolescente, mas que não colobora, isso não.

O amor é das maiores promessas jamais cumpridas. Depois vem trabalho, formando os dois eixos fundamentais da vida; realização profissional, dizem. Quer dizer, depois que você descobre que não devia se casar, porque achava que era uma coisa que não era, e inventa de ter filhos pra “preencher a vida”, volta-se pro serviço, se pode. Às vezes, antes mesmo de se casar, ou em vez de se casar. É uma tentativa válida, alguns conseguem, como sempre existe quem consiga alguma coisa, levando o resto a imaginar que também pode.


O romântico em mim diz que há uma saída, que tem a ver com os idealismos mais inconsequentes, porque desprovidos de cartão de crédito, estabilidade financeira, implicando algum tipo vago de revolução social, não socialista, mas mais puxada pra ação social, tipo aquele desejo fofinho e nem um pouco prático de “ajudar as pessoas”. Se você conseguir transformar esse slogan em algo parecido com uma vida em tempo integral, talvez seja menos frustrado e egocentricamente entediado que a maioria acima descrita. Boa sorte.

E tem que a gente só acha o mundo tão tosco por causa das pessoas nele. Isto é, não são os furacões e terremotos que nos aborrecem, ou câncer, ou crianças nascendo sem braços e outras deficiências, isso tudo a gente aceitaria muito bem. O que torna a vida eventualmente miserável são os outros, que somos nós. Por isso, a conclusão é que a maioria das pessoas está contra nós, que estamos contra as pessoas, pela razão de sempre: por nós mesmos. Yes, that same old song, chap: a tragédia do nosso egoísmo em quantos atos você queira.

Minha tendência é achar que 70% das pessoas são toscas e que as poucas pessoas legais que existem são exatamente aquelas que eu chamo de amigos, com algumas exceções, que reconheço porque sou muito razoável a ponto de saber que nem todo o mundo que presta vai gostar de mim, porque nem todo o mundo combina e então é melhor seguir cada qual o seu caminho. A tosquice das pessoas consistindo não tanto em maldade intencional, ou seja, crueldade, mas ignorância e acomodação diante do sofrimento e do mal com argumentos incrivelmente razoáveis e superficiais. Amém.

domingo, 27 de setembro de 2009

Pra coisa não esfriar

1 Descobri que todas as frases que eu escrevo são esquisitinhas, mas tudo bem, que isso é estilo. Eu, como aqueles motoristas que, obrigados pela empresa, colocam um adesivo na traseira do veículo perguntando como estão dirigindo, pergunto: como estou escrevendo? As minhas frases são esquisitinhas mesmo? Ou estou só tendo mais um surto de TOC, se é que é adequado falar em surtos, mas é o que eu sinto.

2 Aí depois eu invento um esquema e me acalmo. A frase – sim, falo como Flaubert, “na frase” – fica ok, e eu descanço até ser novamente tomado de uma desconfiança horrível até do artigo “a”, que não devia ser usado. Logo estarei como Perec, que, segundo ouvi, mergulhou tão fundo naquele experimento de escrever um romance inteiro sem usar a letra “e”, que no francês é onipresente, a ponto de começar a achar que a letra estava perseguindo-o. Sim. Mas vocês já viram a cara do Perec? Explica muita coisa.

3 Mas eu queria mesmo era me sentar e escrever algo bombástico sobre o amor. Queria escrever O Segredo do amor, O Código da Vinci do amor, A Cabana do amor, o Ninguém é de Ninguém do amor. Pessoas no metrô lendo sobre o amor segundo eu. Que contribuição. Que megalomaníaco. Mas minha, er, vida amorosa está parada desde janeiro. Isso não é bom nem ruim. Nesse meio-tempo pessoas muito próximas, que acreditavam no amor, deixaram de acreditar ou pelo menos sossegaram, e outras que não acreditavam, se não passaram a acreditar, pelo menos ficaram bem promíscuas em nome do amor. Quer dizer que todo o mundo continua tateando, literalmente ou não, nos relacionamentos. Eu vos lamento, senhores.

4 A única coisa que nos tem salvado, como sempre, é a amizade. Se em todo o resto nós somos absolutamente desastrosos, o que não chega a ser verdade, pelo menos – o que é muito – temos sido amigos. Se querem uma definição de amor honesta, é isso: amor é amizade, amizade é amor. Um amigo é a expressão do amor desinteressado e incondicional que esperamos dos relacionamentos amorosos, até agora sem sucesso, quase sempre por nossa culpa. CULPA.

5 E essa semana eu vi A Onda, um filme alemão excessivamente esquemático. É um High School Musical sobre as origens e natureza dos regimes fascistas. O problema é que é uma obra de tese. E teses são carnívoras: comprometem desde complexidade psicológica até desenvolvimento dramático. Os personagens não são pessoas, de carne e osso, mas ideias. Eles ilustram pontos. Em vez de se expressar, eles argumentam. Todas as suas palavras e atos são silogismos. Tudo se curva ao esquema. É a única forma de comunicação da tese. E é raso demais. Mas aprendi que é fácil ser Führer. Semana que vem, tento.

sábado, 19 de setembro de 2009

Cabelo crespo, cabelo ruim, cabelo pixaim

Tenho uma opinião sobre gente normal. Gente normal é ruim. Não biologicamente, como se genética e determinismo entrassem na história. A princípio eu ia dizer que era uma escolha. Que era moral. Mas seria supor que as pessoas andam pensando mais do que realmente pensam. Que ingênuo.

Aí eu comprei um sorvete e, enquanto tomava, vi que normalidade tem a ver com higiene. Porque o sorvete escorria todo pelo meu braço, que eu era obrigado a lamper desde o cotovelo.

Daí que ser normal é uma questão de limpeza. Você precisa estar limpo. Sem meleca nem mistura. E sujar-se é muito fácil. Envolver-se suja. Trocas em geral. Mesmo de ideias, que podem subverter convicções antigas. Imagine de emoções, que talvez te inutilizem pra sempre.

E gente limpinha é só gente esquisita disfarçando. Porque gente normal é absolutamente limpa. Pura. Por isso é que é ruim. Bondade suja. Bondade despenteia. Tanta coisa nessa vida despenteia. Beethoven despenteia. E muito. Mas bondade mais. Porque bondade tem a ver com curvar-se e deixar a nuca à mostra. Gente normal anda ereta. E nunca corre. Correr é indigno. Fosse possível, gente normal nem comeria. Quem come é obviamente inferior a quem não come. E quem está de pé, a quem está sentado. Gente normal prefere ficar sentada.


E você precisar ter certeza. Dúvidas são como manchas no cérebro. Corre-se o risco de se aprofundar alguma coisa. Aprofundar-se é como enfiar a mão no ralo do banheiro pra tirar tufos de cabelo acumulados ao longo de semanas e procedentes de várias partes do corpo humano. Gente normal já é aos 20 o que vai ser pelo resto da vida. Gente normal fica pronta rápido. É muito prático ser normal.

E gente normal não incomoda. Não incomoda porque não se importa. Importar-se é anti-higiênico. Ser normal é não pôr a mão. O problema em gente esquisita é que elas vivem colocando a mão em tudo, inclusive onde não se deve. Pensar muito, por exemplo. É como pegar em corrimão de metrô e depois colocar a mão na boca. Nojo.

Gripe suína não se espalha em ambiente cheio de gente normal. Quem transmite doença é gente esquisita. Claro. Gente esquisita não lava as mãos depois de ir ao banheiro. Anda com as unhas pretas. E despenteada. Por mais limpa que possa estar, gente esquisita sempre está despenteada. Tem a ver com a gravidade. A natureza querendo jogar gente esquisita pra fora do planeta Terra. A natureza é bem normal.

Por tudo isso é que o meu filho vai ser normal. E de proveta. Ou clonado. Senão, suja.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Cinecontraste: A orfã/ Arrasta-me para o inferno

Não é de hoje que o cinema nos dá suspense e terror, fazer as mocinhas pularem no colo dos seus acompanhantes é truque antigo do cinema, se pensarmos, as mocinhas pulam no colo dos rapazes muito antes do próprio cinema(ainda bem). O cinema funcionando como catarse e ajudando namoros: quantos relacionamento não se firmaram ou se formaram depois de uma sessão de sustos? Incontáveis...
Hoje estamos infestados dos ditos cujos “filmes de sustos” e no pacote aqueles filmes ultra violentos como Saw e seus derivados. Cansado de assistir Saw 5 e ficar sem entender nada porque não assisti os quatro anteriores, cansado das seqüências e das pré seqüência de O grito, como também de todos aquelas variantes copiadas de filmes japoneses onde tem uma menina morta que sair de um poço, TV ou qualquer buraco que um alma penada pode sair. Enfim, fui ao cinema e acabei pegando um sessão dupla: um filme atrás do outro, lembrando muito aquilo que existia na remota década de 70 que tentou ser revivido por Tarantino e Robert Rodriguez em Grindhouse. Tal projeto aqui, na terra brasilis, foi retalhado pelos nossos adorados e venerados distribuidores... vergonha e idiotice, pois uma pessoa em sã consciência e com posse das suas escolhas dificilmente se aventura a assistir um filme que seja dirigido somente pelo parceirão 100% do Tarantino.

Lado “A”: A menina má.com conhece o anjo malvado
Filme de suspense que se preze, além de uns sustinhos guardados em cada momento, precisa ter um bom vilão: carisma e afeição pelo público são quase requisitos mínimos. O problema foi quando Hollywood achou que poderia colocar qualquer criança com uma faca de rocambole e provocar sustos no público. É o seguinte; se ela não estiver possuída por nenhum demônio/alienígena/serial killer , como alguém que não alcança a prateleira de cima do armário da cozinha pode ser terrivelmente perigoso e fatal? No máximo a criança é uma peste insuportável, você dá um bica que ela se afasta, pode ser mais cruel e afastá-la segurando a cabeça: a pobre coitada vai tentar te pegar, mas com aqueles braços curtinhos vai ser difícil.


Pensava que o argumento da “A órfã” era esse: pais desgraçadamente azarados adotam uma criança que na verdade esconde um terrível segredo que prejudicará todos os alicerces desta já fragilizada família que acabara de perder um filho. De certa forma, não é bem esse, eles não apelaram para ocasional e freqüente possessão. Ainda sim o filme escorrega em muitos erros bobinhos, de gente pequena. A menina que adotaram, expatriada do Leste Europeu, começa a fazer suas estripulias e o filme vai ganhando ares de suspense, até tentar assustar a platéia com uma menina de onze anos, soa cômico e não é que a menina não é convincente; as crianças são o que há de melhor no filme, ótimas interpretações desses pequenos atores, com especial destaque para a protagonista; agora, os pais, estes deveriam fazer algum cursinho de verão de Artes Cênicas urgente.


No final das contas o filme não é tão ruim, comparado aos filmes de terror que se levam a sério, está numa boa posição. E o que aprendi com esse filme? Nunca adotar refugos do Leste Europeu...


Lado B, que lado B por sinal: o feijão com arroz de Sam Raimi
Homem Aranha 3 estreiou em algum período funesto de 2007: um filme que mostra a transformação de Peter Parker em revoltado(emo?) ao mesmo tempo que quase acabara com jovem carreira do diretor do filme, Sam Raimi. Dizem que o dedo de Tobey Maguire contribuiu para aquela merda que foi e é o terceiro filme do aranha, discussões a parte, depois disso nunca mais ouvira falar de Sam Raimi. Até anunciar que resolvera abandonar por um tempo a viúva emo, Peter Parker, e recomeçar realmente da onde parou e fazer o que sabia fazer melhor: filme de terror com grandes sacadas de humor negro.


Sam Raimi começou sua carreira de cineasta de fato com a trilogia de Ash, interpretado pelo fantástico Bruce Campbell. O protagonista de Noite Alucinante era cativante, o filme tinha monstro, zumbis, demônios e sempre com um tom de certa irreverência: apresentando cenas inusitadas e muito engraçadas. Ao fazer um filme de terror se aproveitava e zomba descaradamente da fórmula que nos fazia engolir, até o começo da década de 90; Jason, Freddy, Hallowen com sua safra interminável de sustos e seqüências que demonstravam que nem se o universo se extinguisse, aquelas monstros continuariam voltando. O ponto mais fortes nas obras de começo de careira de Raimi era nunca se levar tão a sério, atitude que não fez quando realizou o terceiro filme do cabeça de teia.

Grande filme sem ser poser e nem se levar a sério


Arrasta-me para o inferno é um roteiro manjadíssimo: mulher que recebe uma maldição de um cigana tem três dias( chupa essa, garotinha do Chamado) para tentar se livrar antes que um demônio surja e faça o que diz no título. Todas as convenções e clichês são utilizados e abusados de maneira criativa, inclusive para provocar risos: o filme é uma grande montanha russa alternando altos picos, onde impera o gênero terror com grandes declives, onde apresenta cenas fantásticas de humor negro.

Com uma trilha muito boa, assim vem pergunta: um filme faz a trilha ou seria o contrário? Com duas teclas Steven Spielberg teve seu vilão apresentado no melhor filme da sua carreira. Hitchcock com cenas rápidas e uma trillha dramática, um dos melhores momentos do cinema. Sam Raimi extremamente auxiliado pela trilha consegue fazer Arrasta-me para o inferno um dos melhores filmes de terror dos últimos tempos, sem se esforçar, trazendo o seu já manjado feijão com arroz sangrento.

domingo, 13 de setembro de 2009

On love for men

A maioria das pessoas inteligentes que eu li não acredita no amor. E a maioria das pessoas inteligentes que eu conheço finge que não acredita no amor. Essa disparidade pode ser facilmente explicada. Escrever é um modo de antecipar a morte. Quem tem um pingo de senso só escreve algo que imagina que não fará as pessoas rirem do defunto na posteridade. As pessoas inteligentes escrevem então para serem lidas depois de mortas. É um padrão de qualidade. Mórbido. Mas eficiente.

“Pois é, o amor não existe, e agora estou morto, etc, etc, fim.”

Quando estão mortas, as pessoas inteligentes se sentem livres para admitir que aquilo que era a maior promessa de felicidade de suas vidas não existia. Podem admiti-lo sem se sentirem humilhadas por serem tão burras. Estão mortas.

Você só será feliz se encontrar a garota certa. A garota certa é a promessa do amor em sua vida. E o amor, por sua vez, é a maior promessa de felicidade de sua vida.

Todo o mundo vive dizendo que não acredita no amor verdadeiro. Mas nem 10% das pessoas se perguntam o que é o amor verdadeiro. Isso porque mais de 90% das pessoas não são nem um pouco filosóficas. Não que a vida ficasse melhor ou mais fácil se as pessoas decidissem se perguntar pelo significado das coisas. As coisas no máximo demorariam mais pra acontecer. As pessoas levariam quinze minutos para cometer cagadas que normalmente aconteceriam em cinco.

Mulher bonita.

Mulher bonita é o aceno do diabo de auto medieval quando você só está de passagem. Todo pimpão por ser um jovem solteiro com a vida toda pela frente. A vida cheia de promessas é como uma flor que você leva ao nariz para sentir seu perfume numa manhã quente de janeiro. E depois um hálito gelado que sussurra muito perto da sua jugular sugere que você está deixando a vida passar. E você se perturba intimamente com o fantasma do carpe diem negligenciado. Burrão.

Mulher bonita é o depósito de ideal de todo homem pra manter a sanidade e não ceder ao cinismo debilitante da época. Ele pode desperdiçar seus dias num emprego que subestima sua inteligência e ignora seus valores e anseios mais básicos. Ele pode vender sua alma a cada sorriso forçado e aperto de mão contrariado. Ele pode – na verdade, se permite – isso e muito mais. Tudo porque no final ele será redimido pelo amor. Essa é a sua crença. Consciente ou não. E certamente brega. É ela que explica sua vidinha, ele ter uma vidinha. O que há de melhor nele é adiado pela expectativa permanente do amor que só uma mulher bonita pode realizar.

Feminilidade é ideologia. Doçura também.

Você só será feliz se encontrar a garota certa. A garota certa é a promessa do amor em sua vida. E o amor, por sua vez, é a maior promessa de felicidade de sua vida. (2)

A garota certa é bonita. A garota certa não é bonita porque você é fútil. A garota certa é bonita porque você não tem tempo nem paciência pra descobrir que a verdadeira beleza é interior. Como você é homem, e homens são muito práticos, você é muito prático e quer o pacote completo. A garota certa poderia até ser feia se não houvesse a mínima chance de a garota certa ser bonita. A mínima chance de a garota certa ser bonita faz a garota certa ser bonita.

Culpa.

Você se sente culpado porque a garota certa é bonita. O fato de a garota certa ser bonita e de você não querer parecer fútil pelo fato de a garota certa ser bonita faz com que você se torne excepcionalmente eloquente e articulado ao romantizar o fato muito simples de que a garota certa é bonita. Então você não diz que esta ou aquela garota é certa porque é bonita. Mas porque ela lembra uma atriz numa cena de um filme qualquer. A garota supostamente certa lembrar uma atriz numa cena de um filme qualquer é o máximo de romantismo num homem.

Romantismo macho.

Quando vou ao cinema ou quando fico em casa lendo um livro, só estou interessado em saber se o herói e a mocinha vão ficar juntos. É o que prende a minha atenção em qualquer história. Não importa o gênero. Não importa se é Henry James ou uma comédia romântica com Zooey Deschanel. Outro dia mesmo eu estava lendo Os espólios de Poynton, um Henry James da fase tardia, ou seja, uma coisa bem abstratamente esquisitinha, que eu não queria parar de ler até descobrir se Flora Vetch, a protagonista, ia ficar com Owen Gereth, filho de Miss Gereth.

O problema é que qualquer porcaria acaba me convencendo se tiver um cara e uma garota que não se sabe se vão acabar juntos. Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem, por exemplo.

Estudo de caso - Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem.

Outro dia eu estava assistindo Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem quando comecei a me perguntar o que aconteceria se Clark Kent casasse com Lois Lane e nunca revelasse sua identidade secreta de Super-Homem. O que aconteceria quando o casamento começasse a se desgastar, o que levaria menos de três anos, porque Lois é o tipo de mulher que manda no marido e se irrita por ele obedecer e Clark é o tipo de cara que obedece se perguntando onde é que estava com a cabeça ao se casar com aquela megera. Lois continuaria se metendo em confusões e precisando ser salva pelo Super-Homem. E o Super-Homem continuaria salvando Lois.

É muito fácil salvar alguém por quem você está apaixonado. Estar apaixonado é inclusive a maior razão pra você querer salvar a vida de alguém. Mesmo que isso custe a sua própria vida ou a destruição do planeta Terra. E esta é justamente a questão. Quantas vezes o Super-Homem teve que escolher entre salvar o planeta Terra ou salvar Lois Lane? Muitas. E em todas elas ele conseguia fazer as duas coisas. E conseguia porque fazia um esforço danado nesse sentido. Só alguém muito apaixonado tem energia pra fazer esse tipo de esforço.

Lois Lane testemunha contra misoginia de comediante.

Imaginemos então que no mesmo dia em que o planeta Terra e Lois Lane novamente corriam perigo, Clark Kent saiu de casa pra salvar o mundo depois de uma discussão incrivelmente longa e sem sentido sobre a tampa do vaso aberta. E então ele se acha no impasse de sempre entre salvar toda a humanidade ou a garota. Só que a garota não é mais aquela que ocupava seus sonhos de adolescente babão. Com o frescor e o fascíncio que só a distância proporciona a uma pessoa. Ela se transformou na mulher que todas as manhãs o recebe na cozinha com uma carranca e a pele em torno dos lábios avermelhada porque acabou de depilar o buço. Porque essa garota tem um bigodinho. (O machismo inutilizou o homem para o bigodinho. Homens simplesmente não conseguem lidar com essa realidade. Claro que o bigodinho é só uma metáfora para as representações sexistas de gênero.)

Lois Lane está presa em uma fábrica de pregos em Metrópolis que vai explodir em menos de dois minutos. Super-Homem está tentando deter quatorze mísseis nucleares que acabaram de ser lançados para diferentes pontos da Terra. Ele pensa no bigodinho. Super-Homem está na Sibéria. Faltam três mísseis. Bigodinho. Super-Homem voa para deter o último dos mísseis. Bigodinho. O míssil está a menos de um quilômetro da superfície da Terra. Bigodinho. Ele segura o míssil com seus superbraços. Bigodinho. Bigodinho. Bigodinho.

Conclusão.

Muitas vezes a grandeza de um homem se resume a saber se ele é capaz de passar por cima de um bigodinho e amar a garota. Mas o problema é que nesse caso o bigodinho é como a manifestação física do gênio horrível da mulher com quem eu nunca devia ter me casado. Você vai me perguntar se não bastava o divórcio. Se era realmente necessário deixá-la morrer na explosão de uma fábrica de pregos. Mas o fato é que eu não disse que Super-Homem escolheu salvar o planeta Terra.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Os 20 filmes favoritos do Quentin Tarantino dos últimos 20 anos

Fiz um texto uma vez comentando sobre uma lista dos filmes favoritos do diretor Kevin Smith, e tentando identificar a influência dos mesmos nas obras-primas (Barrados no Shopping, O Império do Besteirol Contrataca) do rotundo diretor americano. Surfando (blergh!) pela net hoje, acabei me deparando com a lista de filmes favoritos do Quentin Tarantino nos últimos 20 anos. Detesto me repetir, mas farei o mesmo com a lista dele. Logicamente que em doses homeopáticas, já que são 20 filmes. Vamos a ela:


Battle Royale - Kinji Fukasaku (2000) - Penúltimo filme do diretor japonês Kinji Fukasaku, morto em 2003. É um lixão. Mas é a cara do Tarantino. Começou bem.

Igual a Tudo na Vida - Woody Allen (2003) – não é nada surpreendente o fato do Tarantino citar o pior filme jamais feito pelo Woody Allen na lista. Foi o único filme do Mr. Allen que o Taranta conseguiu entender. Muito bem, Quentin! Menino esperto!

Audição – Takashi Miike (1999) – Filme cultuado sobre um pobre viúvo sendo torturado por sua sádica namorada. É praticamente um filme exploitation. O Girl sadic power do filme deve fazer a cabeça do Taranta.

The Blade (Six–String Samurai) – Lance Mugia (1998) – Filme que mostra um guitarrista chamado Buddy (obviamente inspirado no mito Buddy Holly, já que o personagem usava os mesmos terninhos, tipo de cabelo e óculos do cantor) que também é um ás com uma espada na mão. Bocejos. O diretor Lance Mugia viria depois a dirigir o fantástico O Corvo 3, vulgo uma das piores porcarias que eu tive o desprazer de ver na minha vida. Way to GO, Taranta!

Boogie Nights – Paul Thomas Anderson (1997) – Poderia ser uma escolha justa, mas ai lembramos que o Taranta é truta do Thomas Anderson. Mas foi quase.

Jovens, Loucos e Rebeldes – Richard Linklater (1993) – Poderia ser uma escolha justa, mas ai lembramos que o Taranta é truta do Linklater. Mas foi quase.

Dogville – Lars Von Trier (2003) – Poderia ser uma escolha justa, mas ai lembramos que... ah, não, desculpem, não existem provas sobre uma possível amizade entre o Taranta e o Trier, então essa justificativa não é válida. Acho que no caso é mais correto afirmar que a escolha se deve ao velho complexo de “um poser reconhecendo o talento de outro poser”. Obs: eu gosto do filme.

Clube da Luta – David Fincher (1999) – É fácil perceber que O Clube da Luta é o filme que o Tarantino teria dado a vida para fazer. Mas como o filme não é uma colagem de referências como são os filmes do Taranta, e sim um trabalho original e genioso de um diretor de verdade, temos apenas de sentir pena do pobre Quentin. Tadinho.

Friday – F. Gary Gray (1995) – Filme escrito e estrelado pelo rapper Ice Cube (que precisa reformar o maravilhoso N.W.A. mais rápido do que nunca). Já vi algumas vezes, e nunca achei nada demais. O diretor F. Gary Gray é responsável por maravilhas do cinema contemporâneo como O Vingador, Uma Saída de Mestre e Be Cool, filme que conseguiu a proeza de reunir o elenco mais desinteressado no material que encenavam em toda a história do cinema. Mas já ouvi dizer que o Taranta é amigo do Gary Gray. O que não influenciou em nada a sua escolha. Imaginem.

O Hospedeiro – Joon-ho Boong (2006) – Tarantino e o cinema oriental. ZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZ

O Informante – Michael Mann (1997) - Um estranho no ninho. O filme não tem nenhum personagem com nome cool, nem personagens que pertençam a organizações criminosas com nomes cool. Mas tem um bocado de gente usando terno. Talvez seja isso.

Joint Security Area – Chan-wook Park (2000) – Tarantino e o cinema oriental. ZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZZ

Encontros e Desencontros – Sofia Coppola (2003) – Poderia ser uma escolha justa, mas ai lembramos que o Taranta é truta da Sofia Coppola, e, pior, deu uns pitacos no roteiro do filme. Isenção total.

Matrix – Andy Wachowski e Larry Wachowski (1999)– Quando vi que o Quentin Tarantino tinha feito uma lista dos seus filmes favoritos nos últimos 20 anos, eu cruzei os dedos e comecei a repetir mentalmente: “tomara que ele não tenha colocado o Matrix, tomara que ele não tenha colocado o Matrix, tomara que ele não tenha colocado o Matrix”. É, não deu. Pena.

Memories of Murder – John-ho Boong (2003) – Filme que fede de tão ruim. Mas ai notamos ser esse o segundo filme do John-ho Boong na lista. O que já liga o radar de “putz, mais um que é amigo do Taranta”. É uma grande pena, mesmo. E, notando que o senhor Boong é o único diretor a emplacar 2 filmes na lista, concluímos que, para o Quentin Tarantino, o melhor diretor dos últimos 20 anos fora ele próprio é o John-ho Boong! GENIAL, TARANTA! CLAP, CLAP, CLAP!

Policy Story 3 (Supercop) – Stanley Tong (1993) – Um dos filmes protagonizados pelo Jackie Chan no início dos anos 90 que acabaram o revelando para o cinema ocidental. É divertidíssimo, mas ai o cidadão vir e colocá-lo em uma lista dos seus filmes favoritos nos últimos 20 anos vai um longo caminho. Quando você vai fazer 16 anos de idade, Tarantino?

Todo Mundo Quase Morto – Edgar Wright (2004) – Comédia mais superestimada dos anos 00. Mas o Taranta colocou o Edgar Wright para dirigir um dos fakes trailers do fantástico e extremamente bem sucedido Grindhouse. Ou seja: é truta.

Velocidade Máxima – Jan De Bont (1994) – O horrendo Jan De Bont agradece ao Taranta pela lembrança. Pena que ele desistiu de emplacar bomba atrás de bomba em Hollywood e esteja filmando apenas em sua terra natal, a Holanda. Volta, De Bont! O Taranta é seu fã!

Team America – Detonando o Mundo – Trey Parker (2004) – Trey Parker e Matt Stone se acham os Shakespeares da comédia contemporânea. Que lê uma entrevista dos criadores do South Park até imagina estar lendo o Orson Welles falando sobre Cidadão Kane. Como o Taranta também se acha pouco, fico aqui imaginando como deve ser um diálogo entre os 3:

Taranta: -Nossa, Parker e Stone, vocês são geniais!

Parker e Stone, em uníssono: -Não Taranta! Gênio és tu! Gênio és tu!

Taranta: -Vamos fazer uma coisa? Eu digo aqui, em alto e bom som: somos os 3 geniais! Êêêêêêêêêê

Parker e Stone: -Iupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!!!!!

Só para completar: Family Guy humilha South Park. Seth MacFarlane é mito.

Corpo Fechado – M. Night Shyamalan (2000) – Corpo Fechado faz parte da lista de filmes mais chatos já feitos na história do cinema. Publico a lista aqui embaixo.

Filmes mais chatos já feitos:

6- O Sexto Sentido

5-Sinais

4- A Vila

3- A Dama na Água

2-Corpo Fechado

1-Fim dos Tempos

Literalmente. Fim.

Obs: curioso o fato do Taranta não ter colocado nenhum filme do seu amante profissional Robert Rodriguez na lista. Uma pena, já que Taranta certamente poderia ter colocado pérolas como A Balada do Pistoleiro, Spy Kids 1,2,3,4,5,6,7,8, Era uma Vez no México (Leone revirou-se no túmulo com essa), As Aventuras de Sharkboy e Lavagirl, e, claro, o melhor filme de terror de todos os tempos, o poderoso A Prova Final, que revelou ao mundo o talento do Elijah Wood. Mancada, hein, Taranta?

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O Belchior sumiu


Volta, Belchior!

Fantástico mundo novo tem menos de 140 caracteres

A internet é um lugar incrível. Qualquer idiota com algum senso de perseverança pode, de um dia para outro, sair da sua mediocridade pessoal e expandir sua esfera pessoal além dos limites nunca dantes imaginados. Sabemos que, no início, tudo era bom, até Deus nos ensina isso: "Não coma daquela árvore, malandrão". A internet no seu começo era um lugar pacato e tranquilho cheio de frames e gifs mal recortados, tórrida inocência perdida e espurgada; onde cada site mal estruturado com um efeito malandrinho de html poderia nos assustar com seu dinamismo e cores vindas diretas da década de 80. Aqui uso o epíteto velho da nossa querida humanidade: mas o que é bom sempre pode piorar.


Isso era social media

Mircs, web pages pessoais, e-mail, icq, odigo para os mais nerds: não existia nenhum conceito por trás dessas coisas. Minto, existia uns malucos idealistas que pré-diziam toda a massaroca que seria os nossos tempos modernos, mas ninguém além daqueles circuitos acadêmicos estranhos dava oportunidade de fala aos coitados. Voltando, todo aquela parafernália digital existia como perfumaria para a real função da internet: trocar informações e facilitar ações colaborativas. Se avião era meio de transporte, virou arma precisa nas guerras; a energia atômica salvaria o mundo e não apenas ajudaria caras gordos e crianças pequenas a terem exito. Daí regurgito: por que logo a internet seria diferente?

Um revolução digital, sim senhor!


Que tal um sorvete social?

Desde então, meus caros, a internet virou um negócio, legal, cool, moderno. Antes remota e cheia de reclusos com abundância de acnes; agora moderna, antenada(posso twittar do meu celular, cara!). Tão radical quanto Nescau ela cresceu e ganhou várias teorias de caras descolados e jovens que diziam saber tudo sobre ela, caras que dispensavam todos aqueles velhos, mesmo aqueles que falavam dela há muito tempo. Surgiram muito nomes, designações, alcunhas e muitos outros temas vindos dos cientistas de mídias sociais, é, esse é o nome: mídias sociais. Diferente da visão orwelliana das faculdades de jornalismos e mais próxima das veredas pollianas dos cursos de publicidade, a cibercultura tingidas pelas cores dos nossos amigos publicitários, que bonitinho...

Blogs, videos e podcast inundaram a internet; o padeiro da minha rua tem um twitter(alguma coisa com pãozionhosquentesopa!), cheguei a conhecer mendigos com blog(será que ele sobrevivia de adsense?). A dança do quadrado está aí ao mesmo tempo que a saudosa Stephany com seu possante envenenado. Mas cá entre nós, cheguem mais perto, e a parte boa da internet: cadê a rede de convergência de idéias, conteúdo colaborativo, ações sociais? A tal da inteligência coletiva que as vezes surge como relâmpago no meio da tempestade? O ponto é justamente esse, perca tempo: os nossos amigos da social media, nós dizem para nós mantermos antenados onde surge uma mídia social nova a cada segundo... gostaria de saber cadê aquele negócio bonito que não era toda essa perfumaria e somente ela?

Alguém lá no fundo grita: "A Wiki! A Wiki!" Tá... mas e as outras coisas... e alguns me enumeram um monte de coisa, entretanto esse monte quem sabe é aqueles ratos de internet que postam viciadamente até pelo seu ipod(estou falando com vc). Meu tio não sabe procurar no google, não usa rss e nunca ouviu falar de torrent. Caímos em outro controle e mal uso onde aquele vilão não é só o conglomerado do Tio Disney, nem a Rede Globo, mas seu vizinho, seu colega de faculdade que tem 100 seguidores no twitter; quem sabe, dá uma olhada no espelho., não está se sentindo um tanto maquiavélico hoje?

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Rsrsrsrsrs

O fim politicamente correto da opressão depende do começo da opressão politicamente correta. Acusar o humor como refúgio de racistas e fascistas é um exemplo. Perco a libertação que os politicamente corretos buscam, mas não perco a piada. Mas isto não é um manifesto.

O que aborrece nas almas sensíveis responsáveis pela instituição do politicamente correto como conduta crítica, e não como moralismo rasteiro – o que ele de fato é –, é, no mínimo, a falta de educação. É ser presunçoso da maneira mais grosseira possível. A certeza arrogante de sua própria justiça faz cada palavra sair de sua boca no familiar tom da ameaça. Você se faz juiz do seu irmão. Primeiro sobe num banquinho e do alto da sua superioridade moral recém-adquirida clama contra o fascismo e a discriminação nas entrelinhas de recados em porta de geladeira. Ô, ele está alimentado o ódio e o preconceito contra as minorias fazendo esse tipo de piada, temos que pará-lo, temos que denunciá-lo. Vem cá, nunca ouviu falar em: o sujo falando do mal-lavado?


Me deixa ser profético agora. Ser justo aos próprios olhos acaba sendo o único pecado que cristão e não cristão cometem que vai levá-los para o inferno, se não se corrigirem. Com toda a certeza. E o humor, que é justamente o remédio contra esse tipo de postura obtusa, é o que mais tem sido vigiado e atacado por essa gente justa.

A beatitude do humor se assenta em suas intenções. Quem faz uma piada não quer convencer ninguém da superioridade ariana e/ou masculina. A piada de loira não é um panfleto incitando as mulheres a saírem e afogarem oxigenadas, como no fundo e de fato elas querem fazer. Nem contar piada de português significa que você não vai deixar o Manoel operar o cérebro do seu unigênito. Aliás, se dermos ouvido a esse tipo de correção extrema – promovida pela hipersensibilidade moral dos politicamente corretos –, olhar de cima pra baixo racistas merece a guilhotina, já que contraria o postulado da igualdade entre os homens. E maldizer o indivíduo que preenche todos os requisitos do esteriótipo da loira burra vulgar que rouba namorado é preconceito.

O que estou dizendo é que todos estão condenados. Inclusive você. Inclusive eu. Então, seja mais humilde. E não um fascista ao contrário. Porque estão simplesmente inventando um fascismo arco-íris multiculturalista para combater o fascismo old school. É a mesma imposição que suprime, com simplismo desumano, o longo e difícil processo de aprender a viver e conviver, substituído pela força da lei.

O humor serve pra gente dizer o que não pode dizer. Num lance só, você confessa o pecado e se salva da hipocrisia. Porque, sob a chave do ridículo, as coisas se veem libertas de seu poder de dominação. O humor recontextualiza o mal e assim o neutraliza. Sua função é exorcizar. É uma verdade tão velha que é constrangedor ter que repeti-la. É hermenêutica básica, que estão jogando no lixo. Feminista acusando comediante é tão fascista como quem ri da piada porque é “assim mesmo que preto faz”. Porque ambos estão levando a piada a sério – que seria uma boa definição de fascismo: a piada levada a sério.


Rir não é o problema, e muito menos a piada. O problema é por que se ri. Eis a ambiguidade do humor. Que é a ambiguidade da arte. É perigosa porque a inteligência é perigosa. Esse perigo consiste em deixar que as pessoas tirem suas próprias conclusões, em não tomá-las pela mão com condescendência paternalista ou, se não funcionar, à força mesmo, para que pensem da maneira correta.

A piada não é inimiga. A piada é na verdade o diagnóstico de que as coisas não vão bem. Ela ridiculariza o opressor, e não o oprimido. Porque humor não é desculpa pra ser cretino sem censura. É, ao contrário, autorreconhecimento. A essência da ironia. Um instantâneo do ridículo, e do ridículo da nossa mediocridade. Quem faz a piada se inclui no problema na medida em que expõe o mal, e não o pratica. O piadista não se coloca acima, mas no lugar do opressor. Essa é a humildade do humor.

Estão querendo transformar falta de senso de humor em esclarecimento. Nunca pensei que ficaria do lado dos nazistas. Mas chegou a hora. Hoje vou sair e bater nuns pretos. E comprar minha Playboy.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Fomos ao Cinema ver Brüno

Sacha Baron Cohen é o melhor comediante em atividade no mundo do entretenimento. Seu timing cômico impecável não encontra pares entre os atores em atividade. Se falta ainda um Doutor Fantástico no currículo para podermos pensar em colocar o seu talento em disputa com o do lendário Peter Sellers, perdoamos Cohen quando lembramos que não existem muitos Kubricks dando sopa por aí nos dias de hoje. Mas preciso vir aqui lamentar a obviedade do seu mais novo longa, Brüno, baseado em um personagem do seu programa de comédia na TV inglesa, o The Da Ali G Show, um estilista austríaco gay e extravagante. Enquanto o seu longa anterior, o arrasa-quarteirões Borat, era extremamente bem contextualizado, e mantinha uma narrativa minimamente coerente, o que apenas fortalecia a sátira política presente no filme, Bruno carece pesadamente dos mesmos ingredientes, soando desde o primeiro minuto como um filme feito apenas para lucrar em cima do furor causado pelo filme anterior, e aproveitar o talento de Baron Cohen.

Os menos sensíveis podem matar as saudades do trema

A falta de foco do filme chega a ser vertiginosamente incômoda, visto que ele começa ameaçando seguir o caminho do personagem no programa de TV, fazendo troça do mundo da moda europeu e a sua conhecida superficialidade, voltando então as suas armas para o mundo das celebridades norte-americano e a sua busca insana pela fama, apontado para a batidíssima crítica sobre a adoção de crianças no terceiro mundo pelas celebridades, misturando a isso uma deslocada sátira política dentro do conflito palestino-israelense no oriente médio, para depois, e é ai que mora um dos fatores mais tristes do roteiro, apelar para um alvo fácil e preguiçoso: o choque provocado quando se expõe os valores conservadores do sul norte-americano em conflito com um personagem homossexual e de comportamento confrontador e subversivo.

Mais uma vez Sacha Baron Cohen aponta o canhão para o fanatismo religioso dos americanos, um alvo tão batido nesta década de 00, com os seus 8 anos de administração Bushiana nos EUA, e que já havia sido pintado com cores diferentes e com um efeito bem mais relevante e devastador no excelente Borat, quando Bush ainda morava na Casa Branca e a Guerra do Iraque estava em pleno vapor. Vi que a coisa ia ficar feia no filme quando, bem no seu meio, é anunciado que Bruno iria participar de um programa de televisão em Dallas, no coração do Texas. Sim, Sacha, nós todos estamos carecas de saber, o sul americano é um lugar de conceitos atrasados, valores ultrapassados e obscurantistas, e fanatismo religioso, e um lugar no qual obviamente um estilista europeu que gosta de desfilar por ai de calcinha de oncinha e flertar com congressistas republicanos não seria exatamente bem visto.

A mensagem mais uma vez é clara: fazer humor com os Americans Idiots, como diriam os punks de delineador do Green Day. Não sei se isso é pensado por Cohen e o seu diretor, Larry Charles (que também dirigiu o Borat e era da equipe de roteiristas de um seriado ai, um tal de Seinfeld) para agradar o público alvo do longa, os monetariamente saudáveis norte-americanos dos estados azuis, majoritamente democratas e que adoram ver os sulistas serem alvos de escárnio perante o mundo, na melhor tradição do “esses caipiras são os culpados pelo imperialismo americano, que, se fosse por nós, tão progressistas e libertários, jamais existiria”. Já passou da hora do senhor Sacha Baron Cohen olhar um pouco para o seu próprio quintal. Que tal pegar o personagem Brüno e jogá-lo no coração das cidades industriais inglesas?

Sacha Baron Cohen adverte: a adoção de crianças do terceiro mundo por celebridades é errada, e visa apenas a auto-promoção das mesmas

As mesmas cujos habitantes permitem o crescimento incessante de grupos de extrema-direita, louquinhos para mandar os imigrantes darem um passeio para bem longe das terras da Rainha? E que são tão conservadores quanto os surrados sulistas norte-americanos? Mas Baron Cohen é um inglês orgulhoso. O seu país, que foi vital para o estabelecimento do conflito no Iraque, motivado pelo tórrido romance entre George W. Bush e Tony Blair (que foi curiosamente esquecido pelas armas de Cohen no Borat), está acima de tudo isso. Tem consciência política, social e ideológica, trata com respeito gays, lésbicas, imigrantes e minorias, e não merece ser o alvo das inteligentes e calculadas troças de Cohen. Nem as outras nações civilizadas da Europa, esse continente fantástico que jamais gerou atrocidades como o neocolonialismo, o fascismo e o nazismo. O negócio é todos darmos as mãozinhas e cantarmos que “ nós não queremos ser um idiota americano” com a banda punk de delineador, em vez de olharmos para o próprio umbigo. Bode expiatório melhor não há. Ah, antes que me esqueça: o filme é hilário. Cohen consegue tirar humor de pedra. Mas o incômodo gerado pelas suas intenções obscuras quase joga tudo pelo alto. Já passou da hora de Sacha Baron Cohen criar coragem e nos mostrar os idiotas ingleses, franceses, alemães, espanhóis, italianos... Vai virar homem ou não, rapá? Ops, acho que rolou aqui uma homofobia bem básica... Como todos sabem, os idiotas vivem dentro de todos nós. The answer is blowin' in the wind, como diria o orgulhoso idiota americano Bob Dylan.


Obs: em protesto contra o tratamento que ando recebendo por parte dos meus inimigos, tanto internos quanto externos, escrevi o texto com o punho esquerdo levantado. Não vou negar que não foi lá muito confortável teclar assim, mas a resistência se faz necessária. Se um dia eu aparecer morto em algum porta-mala por ai, vocês já sabem quem foi o meu algoz. E eu fiquei feliz, pois foi o meu primeiro texto em muito tempo no qual eu não cito o filme Grupo Baader-Meinhof.

Sério, Progressista, NINGUÉM AGUENTA MAIS ESSA PIADINHA INTERNA, POMBAS! SEU CRETINO!