domingo, 13 de setembro de 2009

On love for men

A maioria das pessoas inteligentes que eu li não acredita no amor. E a maioria das pessoas inteligentes que eu conheço finge que não acredita no amor. Essa disparidade pode ser facilmente explicada. Escrever é um modo de antecipar a morte. Quem tem um pingo de senso só escreve algo que imagina que não fará as pessoas rirem do defunto na posteridade. As pessoas inteligentes escrevem então para serem lidas depois de mortas. É um padrão de qualidade. Mórbido. Mas eficiente.

“Pois é, o amor não existe, e agora estou morto, etc, etc, fim.”

Quando estão mortas, as pessoas inteligentes se sentem livres para admitir que aquilo que era a maior promessa de felicidade de suas vidas não existia. Podem admiti-lo sem se sentirem humilhadas por serem tão burras. Estão mortas.

Você só será feliz se encontrar a garota certa. A garota certa é a promessa do amor em sua vida. E o amor, por sua vez, é a maior promessa de felicidade de sua vida.

Todo o mundo vive dizendo que não acredita no amor verdadeiro. Mas nem 10% das pessoas se perguntam o que é o amor verdadeiro. Isso porque mais de 90% das pessoas não são nem um pouco filosóficas. Não que a vida ficasse melhor ou mais fácil se as pessoas decidissem se perguntar pelo significado das coisas. As coisas no máximo demorariam mais pra acontecer. As pessoas levariam quinze minutos para cometer cagadas que normalmente aconteceriam em cinco.

Mulher bonita.

Mulher bonita é o aceno do diabo de auto medieval quando você só está de passagem. Todo pimpão por ser um jovem solteiro com a vida toda pela frente. A vida cheia de promessas é como uma flor que você leva ao nariz para sentir seu perfume numa manhã quente de janeiro. E depois um hálito gelado que sussurra muito perto da sua jugular sugere que você está deixando a vida passar. E você se perturba intimamente com o fantasma do carpe diem negligenciado. Burrão.

Mulher bonita é o depósito de ideal de todo homem pra manter a sanidade e não ceder ao cinismo debilitante da época. Ele pode desperdiçar seus dias num emprego que subestima sua inteligência e ignora seus valores e anseios mais básicos. Ele pode vender sua alma a cada sorriso forçado e aperto de mão contrariado. Ele pode – na verdade, se permite – isso e muito mais. Tudo porque no final ele será redimido pelo amor. Essa é a sua crença. Consciente ou não. E certamente brega. É ela que explica sua vidinha, ele ter uma vidinha. O que há de melhor nele é adiado pela expectativa permanente do amor que só uma mulher bonita pode realizar.

Feminilidade é ideologia. Doçura também.

Você só será feliz se encontrar a garota certa. A garota certa é a promessa do amor em sua vida. E o amor, por sua vez, é a maior promessa de felicidade de sua vida. (2)

A garota certa é bonita. A garota certa não é bonita porque você é fútil. A garota certa é bonita porque você não tem tempo nem paciência pra descobrir que a verdadeira beleza é interior. Como você é homem, e homens são muito práticos, você é muito prático e quer o pacote completo. A garota certa poderia até ser feia se não houvesse a mínima chance de a garota certa ser bonita. A mínima chance de a garota certa ser bonita faz a garota certa ser bonita.

Culpa.

Você se sente culpado porque a garota certa é bonita. O fato de a garota certa ser bonita e de você não querer parecer fútil pelo fato de a garota certa ser bonita faz com que você se torne excepcionalmente eloquente e articulado ao romantizar o fato muito simples de que a garota certa é bonita. Então você não diz que esta ou aquela garota é certa porque é bonita. Mas porque ela lembra uma atriz numa cena de um filme qualquer. A garota supostamente certa lembrar uma atriz numa cena de um filme qualquer é o máximo de romantismo num homem.

Romantismo macho.

Quando vou ao cinema ou quando fico em casa lendo um livro, só estou interessado em saber se o herói e a mocinha vão ficar juntos. É o que prende a minha atenção em qualquer história. Não importa o gênero. Não importa se é Henry James ou uma comédia romântica com Zooey Deschanel. Outro dia mesmo eu estava lendo Os espólios de Poynton, um Henry James da fase tardia, ou seja, uma coisa bem abstratamente esquisitinha, que eu não queria parar de ler até descobrir se Flora Vetch, a protagonista, ia ficar com Owen Gereth, filho de Miss Gereth.

O problema é que qualquer porcaria acaba me convencendo se tiver um cara e uma garota que não se sabe se vão acabar juntos. Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem, por exemplo.

Estudo de caso - Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem.

Outro dia eu estava assistindo Lois & Clark – As novas aventuras do Super-Homem quando comecei a me perguntar o que aconteceria se Clark Kent casasse com Lois Lane e nunca revelasse sua identidade secreta de Super-Homem. O que aconteceria quando o casamento começasse a se desgastar, o que levaria menos de três anos, porque Lois é o tipo de mulher que manda no marido e se irrita por ele obedecer e Clark é o tipo de cara que obedece se perguntando onde é que estava com a cabeça ao se casar com aquela megera. Lois continuaria se metendo em confusões e precisando ser salva pelo Super-Homem. E o Super-Homem continuaria salvando Lois.

É muito fácil salvar alguém por quem você está apaixonado. Estar apaixonado é inclusive a maior razão pra você querer salvar a vida de alguém. Mesmo que isso custe a sua própria vida ou a destruição do planeta Terra. E esta é justamente a questão. Quantas vezes o Super-Homem teve que escolher entre salvar o planeta Terra ou salvar Lois Lane? Muitas. E em todas elas ele conseguia fazer as duas coisas. E conseguia porque fazia um esforço danado nesse sentido. Só alguém muito apaixonado tem energia pra fazer esse tipo de esforço.

Lois Lane testemunha contra misoginia de comediante.

Imaginemos então que no mesmo dia em que o planeta Terra e Lois Lane novamente corriam perigo, Clark Kent saiu de casa pra salvar o mundo depois de uma discussão incrivelmente longa e sem sentido sobre a tampa do vaso aberta. E então ele se acha no impasse de sempre entre salvar toda a humanidade ou a garota. Só que a garota não é mais aquela que ocupava seus sonhos de adolescente babão. Com o frescor e o fascíncio que só a distância proporciona a uma pessoa. Ela se transformou na mulher que todas as manhãs o recebe na cozinha com uma carranca e a pele em torno dos lábios avermelhada porque acabou de depilar o buço. Porque essa garota tem um bigodinho. (O machismo inutilizou o homem para o bigodinho. Homens simplesmente não conseguem lidar com essa realidade. Claro que o bigodinho é só uma metáfora para as representações sexistas de gênero.)

Lois Lane está presa em uma fábrica de pregos em Metrópolis que vai explodir em menos de dois minutos. Super-Homem está tentando deter quatorze mísseis nucleares que acabaram de ser lançados para diferentes pontos da Terra. Ele pensa no bigodinho. Super-Homem está na Sibéria. Faltam três mísseis. Bigodinho. Super-Homem voa para deter o último dos mísseis. Bigodinho. O míssil está a menos de um quilômetro da superfície da Terra. Bigodinho. Ele segura o míssil com seus superbraços. Bigodinho. Bigodinho. Bigodinho.

Conclusão.

Muitas vezes a grandeza de um homem se resume a saber se ele é capaz de passar por cima de um bigodinho e amar a garota. Mas o problema é que nesse caso o bigodinho é como a manifestação física do gênio horrível da mulher com quem eu nunca devia ter me casado. Você vai me perguntar se não bastava o divórcio. Se era realmente necessário deixá-la morrer na explosão de uma fábrica de pregos. Mas o fato é que eu não disse que Super-Homem escolheu salvar o planeta Terra.

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