terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Empiristas e bizantinos

No primeiro mundo da mente ou na vida do Espírito existem dois tipos de pessoas dos quais se pode fazer parte simultaneamente, mas no geral ou se é de um ou de outro: gente burrinha de bom gosto e gente que gosta de filosofia e se veste mal. Vestir-se mal subentende ler coisas chatíssimas; gente pra quem não se pode solicitar dicas de leitura, e falo a quem realmente gosta de ler e entende o que lê: conselho, afastem-se de pessoas que carregam a Fenomenologia do Espírito debaixo do braço.

Gente burrinha de bom gosto é espirituosa e tudo, e zomba dos filósofos, mas no fundo é ressentida porque só consegue ler Chesterton, que é inglês, e todo o mundo sabe que inglês pensa como quem desentope privada. Mas admiro como anglo-saxões escrevem; é tudo muito claro e concreto. É por isso também tudo muito simplista, bom pra gente que não tem tempo a perder; seu chefe, por exemplo. Acho mesmo que gente burrinha de bom gosto, que lê Evelyn Waugh e acredita que o espírito pode e deve principalmente se divertir, são todos ingleses ou queriam ser. Bom lembrar que foram os ingleses que inventaram o jornalismo. Não foram?

Evelyn Waugh era homem.

Mas gostam mesmo de livros e de literatura; não é só por afetação. Tá, bobagem, todo o mundo que gosta de livros gosta por afetação. Como ser diferente tendo crescido ouvindo grunge diante de uma TV?

Já gente que gosta de filosofia e se veste mal não é muito ligada em diversão; é mesmo meio masoquista. Não tem muita sensibilidade pra poesia e literatura em geral. Gosta de Chico Buarque, que é poeta, e acha cinema chinês a melhor coisa do mundo. Mas estuda Hegel, lê Heidegger e entende; sempre entra na sua casa com os pés sujos de idealismo alemão. Tende a achar existencialismo coisa de bicha, e burra, e Camus junkie food, mas não é raro ter O Estrangeiro entre os favoritos (também leu pouco; convenhamos, quem realmente lê Hegel só lê Hegel, não teria tempo pra outra coisa). E nem preciso falar o que é que acham de Schopenhauer e filósofos legíveis em geral. Grande chance de gostarem de Zíbia e Clarice, só não sei se vão se referir a elas desse jeito, pelo primeiro nome, a não ser que sejam alunos de Letras.

Quem diz que o Chico é fanho não ama o Brasil.

Acho que o que mais me importa nisso tudo é perceber como os dois grupos entendem a linguagem de maneira muito diferente e que eu acabo concordando com os últimos nesse ponto. Pois gente burrinha e de bom gosto acha que é possível falar sobre qualquer assunto com simplicidade e elegância. Qualquer. Só porque são muito práticos e não estão nem aí para o Ser. Mas gente que gosta de filosofia e se veste mal entende que o objeto requer sua forma, que claro que será truncada e complexa se o tema o for.

Não preciso dizer que ser chato é escrever mal, mas que equacionar chato e difícil é coisa de gentinha.

Um comentário:

  1. Ah quer saber... mesmo sendo burrinha de bom gosto, eu fico muito feliz quando leio este blog.

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