domingo, 19 de agosto de 2007

Fluorescent Adolescent, do Arctic Monkeys (o clipe, não a música)

Os videoclipes acabaram com a nossa geração. Principalmente com a capacidade da nossa geração de contar uma história. Quer dizer, não é que acabaram. Na verdade, eles apenas refletem, confirmam uma idéia muito cara ao circo acadêmico: a de que nossa experiência é fragmentária, de que a vida já não é totalidade, pois a totalidade (da vida) se perdeu quando se descartou o mito. Pois, nos videoclipes, o que vemos, com raras exceções, é justamente um recorte episódico da vida.

Por isso, eu devia, para alardear minha desaprovação disso, já que eu sou um sujeito que não nego totalidade à vida – como um bom fundamentalista, as coisas, pra mim, fazem sentido; portanto, a minha vida tem um sentido –, proscrever a simples menção dos videoclipes em meus textos. Só que não vai ser assim, né? Pois se eu vim com essa ladainha toda, é porque ia acabar falando de videoclipes, sim, e vocês já estavam sacando desde o início.

Daí que eu estava vendo o videoclipe do Arctic Monkeys, da música Fluorescent Adolescent. E eu não sei se vocês sacaram (e se não sacaram, finjam que é assim, pros efeitos desta postagem), mas a idéia é chupada de Laranja Mecânica. Duas gangues quebrando o pau, em câmera lenta, só que uma das gangues é composta por palhaços. Ou seja, o mesmo contraste visual entre máscara e ação no clássico kubrickiano. E, como certa linha crítica não hesitaria em sentenciar, se é chupado de Kubrick, então é genial. Portanto, Fluorescent Adolescent é ge-ni-al.

E o melhor de um videoclipe é justamente a liberdade que oferece ao diretor. Uma vez que letra de música não precisa fazer sentido se os arranjos são bons, o único cuidado que se deve ter em relação às imagens escolhidas é com uma vaga semelhança entre o tom delas e o da melodia e, se for o caso, com uma ainda mais vaga alusão a algum elemento constante nos versos sem pé nem cabeça que enchem o cancioneiro pop. Em Fluorescent Adolescent, por exemplo, se não me engano, a letra dos rapazinhos ingleses trata da disparidade entre os sonhos que a gente tinha pra vida adulta e no que esta veio a se transformar de fato. E se não me engano, de como alguém que o fulano conhecia caiu na vida. Hermenêutica ousada essa minha? Nem tanto.

Pois então, em vez de mostrar a amiga (digamos que seja amiga) de infância rodando bolsinha na esquina, botam uns marmanjos vestidos de palhaço dando uma de Sopranos e, de quebra, ganham a crítica com referências a Kubrick e o escambau. Apesar de que máfia e palhaços têm tudo a ver. Pois, e desculpem os highbrow que porventura vêm aqui nos acusar das nossas imprecisões e superinterpretações, mas Pagliacci, lado a lado com Cavalleria Rusticana (mais uma razão pra serem encenadas juntas), é ópera de mafioso. Da última nem se fala... Não acreditam? Vão ver Poderoso Chefão 3.

Ah, sim, e no final, quando o palhaço pega o isqueiro e se livra da ameaça motorizada, chupado, chupado de Karma Police, do Radiozzzzzz Head. Mas, daí, é ruim, daí, não é nem um pouco ge-ni-al. Porque é Radiozzzzz Head, e não Kubrick.

2 comentários:

  1. ahuahauahuah ladainha mais-que-necessária.
    que bom texto!

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  2. Eu havia percebido certa semelhança do clipe com o clássico do Kubrick mas, achava que estava imaginando demais, afinal no meio em que estava inserido, isso quer dizer eu e mais eu, só eu tinha percebido isso. Mas agora vejo que não estou só no mundo e que Florescent Adolescent é mesmo uma chupada na Laranja Mecânica...

    Heil Kubrick!

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