quarta-feira, 13 de junho de 2007

Seinfeld e Lohan: o caminho da felicidade

Seinfeld é um sintoma. O Muro de Berlim caiu, junto os sonhos da humanidade ruíram. Isso eu já disse. Seinfeld vem logo depois. É o reflexo, uma defesa com que nos arranjamos contra as asperezas do presente. Todos os elementos da personalidade contemporânea desencantada estão ali: o cinismo, a relativização, a leviandade, a ironia, o ceticismo. Isso o Camarada Progressista já disse.

Agora vamos unir essas duas reflexões, em função daquela a quem este mês é dedicado. Para tanto, faço uma pergunta de cuja resposta depende a saúde e, não sendo nem um pouco exagerado, o futuro da senhorita Lohan: pode Lindsay ser cínica?

Sim, eu apelo ao cinismo como tábua de salvação para a menininha. E só como medida emergencial. Minha vontade é de sentá-la diante da televisão para assistirmos juntos duas, três temporadas de Seinfeld de uma vez. Aí, eu pauso e explico pra ela, se for necessário: “Tá vendo, você tem de fazer assim, ser mais assim. Vamos, agora é o episódio do Bubble Boy.”

Gente de bem com a vida – realmente de bem com a vida (e, por favor, atentemos no significado dessa expressão, “de bem com a vida”, isto é, concordar com ela, agradar-se dela, achá-la uma beleza, sair por aí de mãos dadas cantando “We are the Champions” com ela) – não gosta de Seinfeld. É preciso ser minimamente neurótico para se gostar de Seinfeld. Ou melhor, é preciso assumir-se minimamente neurótico. Por sinal, acho que Seinfeld incomoda muita gente justamente por forçar um diagnóstico que eles preferiam continuar ignorando: sim, eu sou neurótico. Outros se irritam com a série porque, sem que eles se dêem conta, aquilo se parece demais com eles. O máximo que dizem, no entanto, é: que monte de bobagem esse programa! Mas há, como eu disse, quem não se encaixe nessas descrições, quem realmente ande de bem com a vida.

O Camarada Moderado, por exemplo. Pra ele a série não desce. É que ele é muito equilibrado, muito moderado. Acaba sendo entediante pra ele ver quatro solteirões novaiorquinos fazendo piada com a possibilidade de um mundo melhor. Mas – e agora eis todo o meu pessimismo, que na verdade considero realismo – um mundo melhor é uma idéia furada. Uma pessoa melhor pode ser. Duas também. Uma comunidade? Mais difícil, mas não impossível. Mas o mundo todo? Não, não acredito em salvação coletiva. Você, nosso leitor, você pode se salvar; na verdade, você já deve estar salvo, fazendo a sua parte, alimentando os pobres, prestando serviços voluntários, procurando ser honesto e correto, lendo este blog. E não porque acha que tem de, mas porque quer fazê-lo. Você é como eu: belo e justo. Mas o mundo todo? Não.

Há quem diga que Lindsay é só uma menina superficial que fica enchendo a cara por causa da vida vazia que leva. Em parte, é verdade. A realidade é como um tijolo com que dão na cabeça dela, e ela só poderia fugir, e quem foge da vida cai no vazio. Um sonho ou fantasia só rendem frutos nobres e prestimosos quando a gente volta pra realidade – justamente onde tais frutos têm valor. Se você permanece no mundo encantado, eles apodrecem. Além de você ser internado, porque ficou maluco ou, como diria um especialista, psicótico.

Mas assim que Lindsay reconhece a realidade, corre à garrafa de cana. E bebe, e cheira, e quer morrer. Como sair disso? Repito: cinismo: “É melhor ter papai e mamãe só de olho na minha grana do que ser órfã. Ser órfão é uma coisa muito triste.” E é melhor ser blasé do que morrer aos 27 anos, idade fatídica entre as celebridades. E nem precisa ficar assim pra sempre. Depois, mais pra frente, quando ela for mais velha e estiver mais conformada e acomodada, como todos ficamos, o cinismo perde a função. Tal como Lola Johnson, personagem que ela interpretou em A Prairie Home Companion, que passa de uma adolescente depressiva a uma yuppie. Eis o caminho da felicidade.

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